Wednesday, February 04, 2015


O TREVO

Na ESCOLA BRASILEIRA, paus e pedras no caminho. Obstáculos transponíveis e aborrecimentos passageiros. 

Sendo o trevo um símbolo UNIVERSAL de SORTE, isso nunca entrou na minha cabeça. 

Talvez esse significado se deva por alguns livretos apresentarem a carta como “paus” e a impressão de má qualidade nos baralhos mais baratos descaracterizarem a imagem levando os pioneiros do petit lenormand no Brasil a interpretá-la como algo ruim.

Na ESCOLA EUROPEIA, a sorte para uns e a pequena sorte para outros; as oportunidades e a alegria.

Sou do “bonde” do CONCEITO, não me convenço com essa de que Lenormand se restringe à palavras-chave e outras baboseiras. Palavras-chave funcionam revelando aspectos do conceito e nos levando até ele, constituindo uma via de mão dupla.

São MEIO e não FIM.

O Petit Lenormand, em sua versão original como Jogo da Esperança era um “jogo moralizante”, portanto, inspirado no simbolismo cristão. Seguindo a direção que esse contexto nos dá, o melhor momento histórico para começar a compreendê-lo é em sua cristianização por São Patrício, na Irlanda, por volta do século V.

São Patrício mostrou a trindade divina numa planta tão comum e simples, o três em um; Pai, Filho e Espírito Santo sendo um só, como as folhas do trevo ligadas pela haste que as sustenta. O trevo de quatro folhas indicaria os quatro evangelhos ou a humanidade acompanhada da trindade, tendo seu aspecto de sorte ampliado pela sua raridade. Então, de três ou quatro folhas, simbolicamente, para nós, o trevo será sempre O TREVO.

A carta dois tem como princípio a ESPIRITUALIDADE NAS PEQUENAS COISAS. A natureza encerra simbolismo profundo em formas simples.

O contato com a planta simboliza o encontro com as formas mais singelas do divino que transcende a própria forma, sendo pleno tanto no infinito do universo quanto nas folhas de um simples trevo.

O seu tamanho o faz imperceptível, mesmo crescendo em qualquer lugar, abundantemente.

Os trevos estão espalhados à nossa volta nos canteiros, vasos, no mato e até nas rachaduras das calçadas.

Ali, debaixo de nossos narizes! Quem vê, leva!

A sorte vista como uma força do destino acionada pelo nosso livre arbítrio.

As oportunidades nos são apresentadas pela vida, cabendo a nós aceita-las ou rejeitá-las num primeiro momento e saber aproveitá-las, em outro. É dessa forma, consciente e proativa que a sorte acontece e pode se multiplicar.

Com o trevo, procure o óbvio. Nem sempre grandes soluções estão em coisas grandiosas.

A carta indica situações que podem, em princípio, parecem insignificantes, mas que devidamente exploradas, podem se revelar poderosamente benéficas e causar um impacto positivo em nossas vidas em curto ou, até mesmo, longo prazo.

Quando o analfabeto do campo, que mal sabe conjugar um verbo e tem um radinho de pilha como alta tecnologia te faz beber o sumo verde de folhas que colheu no mato e macerou cura suas dores e coloca seus órgãos deficientes para funcionar, estamos diante de um momento trevo.

De certa forma, ele nos permite quebrar preconceitos por revelar a grandiosidade das pequenas coisas e a insignificância das aparências.

Tem, também, uma função dinamizadora, pois nos estimula a interagir com a vida, ter atenção aos detalhes e aproveitar as oportunidades. Sem ação, o trevo não tem efeitos significativos e tudo passa rápido.

Vivi uma situação emblemática com uma grande amiga e irmã. Uma angolana espiritualizadíssima, uma grande vidente, que mora em Portugal chamada Maria Ema. Ela vivia cheia de trevos de 4 folhas, de cinco e até de seis!

Um dia, caminhando pelo Parque da Cidade, na cidade do Porto, eu disse-lhe que gostaria muito de achar, pelo menos, um trevo de quatro folhas, pois nunca tivera essa SORTE.

Na mesma hora, ela pediu que eu olhasse para o chão que, naquele momento, eu acharia um. Eu ri, pensando que era uma brincadeira, mas resolvi fazer o que ela disse.

Abaixei a cabeça e vi que havia um pequeno aglomerado de pequeninos trevos entre os meus pés, que eu não havia reparado até o momento. Abaixei-me e passei a mão por eles uma única vez.

Para minha surpresa, saltou um belo trevo de quatro folhas que colhi com grande alegria! A partir desse dia, achei trevos de 4 folhas quase TODOS OS DIAS durante um ano, até o dia da minha viagem de retorno ao Brasil.

Bastou-me fé, confiança na vida, aproveitar a oportunidade e ter iniciativa.

Não desperdicem suas oportunidades e nunca deixei de acreditar que o melhor ainda está por vir!


Tatô e Baralho Cigano


A relação entre os oráculos se dá tanto nas diferenças quanto nas semelhanças, apesar da tendência geral evidenciar superlativamente suas diferenças, criando uma ideia que não corresponde à realidade.

Podemos estabelecer três tipos de diferenças:
Estrutural, iconográfica e simbólica.

A ESTRUTURAL se evidencia no número de cartas e suas estruturas internas.
No tarô temos 78 cartas ou arcanos que se dividem em arcanos maiores e menores.

Ambos os grupos têm função complementar e estruturas complexas. Existe uma linearidade no ordenamento dos dois conjuntos que se dá pelos números ou hierarquia, no caso dos arcanos menores numerados e da corte. Além da ordem sequencial, encontramos outros fatores de que interligam os elementos dos conjuntos de ou formas diferentes através do número e relações simbólicas.

No petit lenormand temos 36 cartas e dois conjuntos:imagens e naipes, como no tarô, porém esses estão contidos um no outro, mesmo sem manter relação direta. Cartas e naipes são independentes. Não se pode ordenar sequencialmente todos os elementos, simultâneamente. Se ordenarmos pelos naipes, desordenamos os números, e vice-versa, optando-se, na maioria das vezes, pelo número.

Naipes e Imagens foram concebidos para funções distintas sendo complementares, somente, através da utilização de algumas técnicas de leitura.

Vemos as diferenças ICONOGRÁFICAS na construção das imagens. Enquanto o tarô obedece a padrões mais rígidos, onde cenários, personagens e suas posições precisam seguir certas regras como, por exemplo, O Mago que deve segurar uma varinha e ter uma mão erguida e outra abaixada, o lenormand já não apresenta essa necessidade. A cegonha, independente de estar se alimentando no lago, cuidando de seu ninho ou voando, manterá seus atributos inalterados. Suas imagens podem ser elaboradas de forma mais livre não estando presas à cadeias simbólicas, sendo mais simples.

As diferenças SIMBÓLICAS se apresentam nos símbolos (sol, lua, torre, estrelas e cavaleiro) utilizados pelos dois baralhos, porém com atributos diferentes ou parcialmente semelhantes.

Como exemplo, temos a lua que no tarô fala de ilusões, medos e inimigos ocultos; enquanto no petit lenormand representa honras, méritos e reconhecimento profissional. Já o Sol, em ambos, divide os atributos de sucesso e alegria, porém o Sol do tarô apresenta um aspecto relacional, simbolizando amor e namoro, que não encontramos no lenormand.

Das semelhanças, a mais importante a ser destacada é: ambos são CARTOMANCIA.

Cartomancia é a arte de prever o futuro através das cartas, então isso engloba todos os tipos de cartas. O tarô é uma variação mais sofisticada de cartomancia, mas não deixa de o ser.
No seu surgimento, ele era tão mundano como qualquer baralho. Seus símbolos eram facilmente reconhecidos e descreviam situações cotidianas como faz o petit lenormand, hj em dia.
Afirmações de que o tarô é mais para perguntas de cunho filosófico e espiritual e o petit lenormand para questões mundanas não se confirmam no dia-a-dia do consultório onde ambos se mostram perfeitamente eficazes em responder perguntas de qualquer natureza.

Da mesma forma, dizer que o tarô dá respostas subjetivas e o petit lenormand objetivas é outro erro grosseiro. A qualidade da resposta está no produto dos estudos e experiência pessoal do leitor que definirão o grau de profundidade da sua interpretação e a linguagem que usará para transmitir essa informação. Portanto, podemos ser tão subjetivos com o lenormand quanto objetivos com o tarô. Esses mitos se construíram durante o processo histórico de ambos os baralhos.

Os dois foram, inicialmente, concebidos para serem jogos de diversão. No caso do tarô, nos séculos XVIII e XIX, ocultistas reconheceram nele características místicas e esotéricas inserindo-o em seus rituais, atribuindo-lhe, assim, novas formas de utilização e funções para que se adequasse às suas necessidades. Posteriormente, houve uma releitura de seus símbolos pelo viés da psicologia junguinana que fez nascer uma nova abordagem que ampliou ainda mais o seu universo. Essas duas interferências marcaram profundamente a história do tarô e como ele passou a ser visto.

Com o lenormand, o processo foi inverso. A sua curta história e a falta de obras e estudos mais profundos, limitou as informações a seu respeito aos livretos que acompanhavam o baralho, e eram compostos por meia dúzia de palavras-chave e um único método de cartomancia rudimentar. Dessa forma, criou-se a falsa ideia que ele se restringia à palavras-chave e, por isso dava “respostas mais diretas” recebendo a alcunha de “Baralho Fofoqueiro”, ao mesmo tempo que se diz que o lenormand só dá respostas por combinações, sendo desaconselhável a leitura com uma só, carta, ao contrário do tarô onde se pode obter respostas com um só arcano. Mais uma vez, a prática descontrói essa falácia, mostrando que uma carta do lenormand, sozinha, é capaz de nos responder o que precisamos saber.

Tarô e lenormand se equilibram na balança. A riqueza simbólica e a complexidade das cartas do tarô é compensada pela atualidade da simplicidade das cartas do petit lenormand que permitem a identificação imediata de seus símbolos, mesmo por quem não as conhece, facilitando o aprofundamento do seu conhecimento através de experiências vivenciais.

Com todas as suas diferenças e semelhanças, a função de ambos é a mesma: proporcionar-nos uma visão mais ampla da vida e maior compreensão de nós mesmo, orientando-nos em nossas escolhas.


Monday, November 10, 2014

WEBNÁRIO ENTRE AMIGOS SOBRE CARTAS CIGANAS

Compartilhando saber! =D

Quem perdeu pode conferir o WEBNÁRIO ENTRE AMIGOS SOBRE CARTAS CIGANAS que rolou nesse sábado, dia 8.

É só acessar os links:

I. https://www.youtube.com/watch?v=qyf7zwS8frE
II. https://www.youtube.com/watch?v=xr0CGCTvus0
III. https://www.youtube.com/watch?v=3YYq5OaZLaM
VI. https://www.youtube.com/watch?v=KdjaENI9qGI

Friday, September 12, 2014

CURSO DE BARALHO CIGANO com Alexsander Lepletier - no Rio


A Lua, Honras, Méritos e Obará

O mito africano de Obará é uma excelente fonte para compreendermos uma das mais importantes partes da carta 32, a LUA, que na Escola Européia que tem como seus atributos mais conhecidos: HONRAS E MÉRITOS.

O sucesso vem de uma atitude nobre e justa ou do aprendizado consciente de qualquer erro e sua correção.

Como elemento celeste e força maior que rege dos ciclos terrestres, ela funciona como um regulador, permitindo que a natureza do que quer que esteja nesse mundo seja vivida de forma pela. Ela nos faz sentir as consequências dos nossos atos, sejam bons ou ruins.

Ela é o KARMA (ação-reação / Méritos) e nos conduz ao Dharma.

...

Axé!

O número 6 nos conta, através de um de seus mitos:

Todos os anos, Olorum fazia uma festa e convidava os números 1 a 16, a fim de que eles prestassem conta de seus atos na Terra.

Encerrada a reunião, todos eram presenteados de acordo com o valor de seus méritos. Naquele ano, porém, a Divindade Suprema resolveu que daria um presente igual para todos.

O número 6 era muito pobre e por isto seus irmãos foram até sua casa, antes da festa, para almoçar. A real intenção era humilhar o dono da casa, que mal tinha como alimentar sua própria família.

Seis deu tudo que tinha guardado para a alimentação do mês. Nem assim deixou de sofrer gozação.

Já cansado de tanta humilhação, ele desistiu de ir à tal reunião. Olorum sentiu sua falta, mas nada comentou.

No final da festa, os números, de 1 a 16 (menos 6), receberam uma abóbora. Todos ficaram revoltados com um presente tão simples e despejaram todas as abóboras na casa de 6.

Eles só não sabiam que os frutos estavam recheados com ouro e joias. No ano seguinte, todos se surpreenderam ao ver que o mais pobre dos irmãos era agora muito rico.

Olorum, então, disse-lhes: Vocês todos têm riqueza, mas 6 tem prosperidade.

Mãe Stella de Oxóssi, do Opô Afonjá

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Saturday, August 30, 2014



A unidade na diversidade.


Cada flor com sua cor e forma dá o seu tom criando a graça do conjunto, evidenciando - se umas às outras através do contraste. 

HARMONIA E BELEZA como as notas e a melodia que compõem uma música. 

O bouquet nos mostra que a diferença acrescenta. Que os diferentes ao se unirem, se fortalecem e trocam emanando os melhores sentimentos de afeto e união.

O CAVALEIRO - 1




 OS 5 SENTIDOS E O BOUQUET

Sendo uma combinação harmônica de elementos que compõem um todo estético e harmonioso com a finalidade de representar um sentimento ou de gerar prazer, o BOUQUET é um grande estimulante dos sentidos.
Tudo que se combine para trazer uma sensação de bem estar encerra em si a carta 9 e nela podemos encontrar OS CINCO SENTIDOS.




A Cruz – Parte I


O Calvário - Cicatrizes profundas, resignação e amadurecimento.

Um símbolo, pela sua natureza associativa e agregadora, diz mais do que se vê à primeira vista, podendo ser lido em vários e níveis. Seus atributos se mostram total ou parcialmente de acordo com o contexto, o que é mais evidente quando possui significados muito diferentes.

A Cruz é um bom exemplo. Principal símbolo do cristo sintetiza a parte mais importante de sua história: cumprimento de sua missão. Para salvar a humanidade, ele morre crucificado, ressuscitando três dias depois. Assim, a cruz não só alude à sua morte e ao sofrimento, como também à sua vitória sobre ela.

A Cruz do Calvário também é a da redenção, descrevendo a vitória, APÓS o sofrimento. A história de Sérgio Silva ilustra importantes aspectos do calvário da carta 36 e sua via crucis.

Fotógrafo freelance, resolveu registrar a manifestação do dia 13 de junho de 2013, em São Paulo e, como relata, foi seu primeiro contato com um ambiente de conflito. Infelizmente, foi vítima da crueldade e truculência policial tendo sido alvejado em seu olho esquerdo, perdendo a visão.

“Silva teve a retina do olho esquerdo deslocada para um lado, afundamento da cristalina e um corte com a perfuração que acarretou em cinco pontos internos, deixando a estrutura ocular totalmente danificada.”

O ataque das forças de segurança é representado pela carta 11, o chicote, arma utilizada no açoite de cristo ao longo da via crucis até o calvário. Essa correspondência religiosa, mitológica e histórica nos fornece elementos importantes para compreensão da relação das duas cartas, nos levando a entender o chicote como parte da cruz, vindo a ser uma das faces da sua experiência e vivência. Através dela que se formam as chagas que se tornarão as futuras cicatrizes, marcas eternizadas de um doloroso período transformador. Tudo isso ganha uma dimensão e um alcance maiores do que o habitual por serem símbolos religiosos, ou seja, há um componente de destino, de uma força maior atuando.
Mesmo sendo um profissional no exercício de sua função, tendo o direito de ter a sua segurança garantida, foi mutilado por quem deveria protege-lo. Sergio Silva só encontrou como resposta da PMSP e do Governo do Estado de São Paulo, o SILÊNCIO. A omissão dos seus algozes garantiu peso extra em seu fardo.

Com feridas físicas, psicológicas e emocionais abertas, o fotógrafo se encontrou desamparado e sem possibilidades de trabalhar, restando-lhe recorrer à família, amigos e à sua fé:

"“Não é um bom momento para mim. Ainda tenho um pouco de trauma. Principalmente por constatar que a violência não parou. Foi o pior dia da minha vida. (...) Assim que tive alta do hospital e fui para casa, eu me assustava sem motivo. Estava sentado no sofá e fazia um gesto brusco, um espasmo acompanhado de uma espécie de grito. Minha filha começou a ter o mesmo tipo de sintoma"

“Ficou também mais difícil de trabalhar. Meu campo de visão diminuiu 50%. Não foi fácil e continua não sendo. Estou tentando me reencontrar como fotógrafo. Todo fotógrafo fecha um olho e deixa outro aberto para fotografar. Mas, antes disso, você precisa ter um campo de visão ampliado, noção de profundidade. E, hoje, tenho isso reduzido. (...) Entretanto, a fotografia é meu instrumento de trabalho e tenho muito gosto por ela. Isso me dá forças para não desistir. ”

Até o dia de hoje, mais de um ano depois, o fotógrafo ainda luta para superar o trauma adquirido e se adaptar aos graves danos permanentes e os temporários que ainda não passaram, causados pela ação brutal e desumana do Estado. Uma das formas de lidar com tamanho peso foi ter-se tornado ativista tendo em uma da de suas pautas a luta pela desmilitarização da polícia.

A carta 36 nos mostra que, por mais que sejamos otimistas em relação à vida, há situações sobre as quais não podemos agir e danos que não podem ser reparados, nos restando duas alternativas: aceitar ou sofrer.

A cruz traz cicatrizes, marcas profundas. Mesmo nas representações de Cristo após a ressureição, ele traz as chagas, as marcas da crucificação. A sua superação exigirá esforço, alta capacidade de resignação e readequação à uma nova realidade, mas também a possibilidade de transcendência espiritual, da aquisição de um significado maior para a vida.

Nela está escrito o destino. O inevitável, a elevação e o crescimento através do sacrifício. A sua haste vertical cruza a horizontal, representando a interferência de um poder superior sobre o mundo físico, o céu penetrando na Terra, interrompendo a linha, formando um divisor, + . Nada será como antes.

Essa experiência extrema pode levar mais do que temos se não formos fortes o suficiente. Esse tom mais intenso é dado pelas cartas que a acompanham.

O destino, situações quem exigem esforço, marcas profundas deixadas por experiências e relações, a sensação de peso, o cansaço, a sobrecarga, o sacrifício e o auto sacrifício; o fardo, a dor.

Esse é UM DOS LADOS da Cruz.

Na segunda parte do texto, falaremos da redenção que será ilustrada por uma experiência pessoal, minha.



Para saber mais sobre o caso do fotógrafo:

http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2014-06-03/ainda-tenho-trauma-de-protestos-diz-fotografo-que-perdeu-olho-um-ano-atras.html

http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/12/06/o-estado-e-mais-cego-do-que-eu-diz-fotografo-que-perdeu-o-olho-em-protesto.htm

http://focusfoto.com.br/justica-dispensa-estado-de-pagar-conta-hospitalar-de-fotografo-que-perdeu-olho-em-protesto/
O CORAÇÃO E O NAVIO

A combinação dessas cartas produz um tom lindo! 

São os sentimentos que vão longe... 

É o coração que aproxima. É o amor cruzando fronteiras.

Há um parão comum a essas duas cartas:



A TROCA.

Os corações se unem num fluxo constante de sentimentos, assim como o navio promove a troca comercial e o contato entre culturas e lugares distantes.

Outro padrão é a capacidade de percorrer longas distâncias e o encurtamento delas.

Para o coração não importa onde o amado esteja, ele estará sempre "lá" e o outro "aqui". O amor gera a motivação e a força necessária para se percorrer qualquer distância para se estar com a pessoa amada ao mesmo tempo que supera as dimensões de tempo e espaço.

O Navio (quer seja em sua versão avião, trem, etc), com seu aparato tecnológico e força mecânica cruza distâncias continentais em pouco tempo.

O par se torna um poderoso potencializador do sentimento, do amor.

Em caso de não haver distância a separar, o aspecto de troca é enfatizado. O amor que se mantém e perpetua através da troca de afeto e experiências de vida. Um aprendendo com o outro, um fornecendo, abundantemente o que o outro não tem.

A empolgação de uma viagem para terras distantes.

O sentimento descrito aqui é empolgante, excitante. Estar com quem ou o que se ama é como viver uma aventura. É como se juntos fossem para terras distantes, fossem para além do mundo. É a expansão (navio) do amor (coração), que cresce a cada dia.


Monday, August 04, 2014

O PETIT LENORMAND, TRADIÇÃO E A ARTE DE LER A SORTE NAS CARTAS - Björn Meuris

Karla Souza nos proporcionará, mais uma vez, a oportunidade de dialogar com mais um dos grandes nomes do Lenormand, Björn Meuris através de mais um webinario:

O PETIT LENORMAND, TRADIÇÃO E A ARTE DE LER A SORTE NAS CARTAS.

Não perca a oportunidade,é gratuito, clique e inscreva-se, já!!!


 http://www.falandolenormandes.com.br/inscricoes-webinario-björn-meuris

Wednesday, June 25, 2014

Mlle Le Normand: Profetisa ou feiticeira? - #journeelenormand - 25 de junho, Dia do Baralho Lenormand



#journeelenormand

Dia 25 de junho, Dia do Baralho Lenormand!


Para celebrar essa data tão Importante, partilho com todos os estudantes, profissionais, pesquisadores e apaixonados, a tradução do capítulo 6, "Mlle Le Normand: Prophet or Sorcerer?" do livro "A Wicked Pack of Cards - The Orignis of the Occult Tarot", de Ronald Decker, Thierry Depaulis e Michael Dummet - St. Martin’s Press – New York – 1996.

O texto é a biografia mais completa e fidedigna de Mlle Le Normand, trazendo informações importantes sobre sua vida, sua forma de trabalho e as ferramentas que utilizava no seu ofício, bem como a relação de seu nome com baralhos como o Grand Jeu, Petit Lenormand e outros. 

Esse texto contém citações aos outros dois que publiquei anteriormente para que tenhamos uma visão clara de como Mlle Le Normand era vista na sua época e de como construiu a sua imagem e fama através de inteligentes e ousadas formas de marketing pessoal, valendo-se de plágios e inverdades, tornando difícil separar a realidade da fantasia.

De qualquer forma, sua fama é inegável: foi a mais célebre e famosa cartomante da história!

... mas que NADA TEVE A VER COM O BARALHO LENORMAND, além do nome.

FELIZ DIA DO BARALHO LENORMAND!!!!





A Wicked Pack of Cards – The Origins of the Occult Tarot
Ronald Decker, Thierry Depaulis e Michael Dummet
St. Martin’s Press – New York – 1996
CAPÍTULO 6

Mlle Le Normand:
Profetisa ou feiticeira?

“Mlle Le Normand, a célebre mística francesa, marcou profundamente a história de forma que a mera referência de sua passagem seria supérflua. Basta dizer que foi Mlle. Le Normand que previu para Napoleão sua fenomenal ascenção e sua queda repentina. Mlle Le Normand foi uma das grande profetisas vivas tendo sido reconhecida pela nobreza da Europa.” É dessa forma que um baralho de 52 cartas fabricado pela The United States Playing Card Company of Cinccinati, chamado Gypsy Witch é apresentado em seu folheto.

O nome de Mlle Lenormand é, provavelmente, mais conhecido que o de Etteilla e seus discípulos. Não só foi a vidente mais popular das primeiras décadas do século XIX como se mantém como a adivinha mais célebre de todos os tempos. Sua popularidade parece se dever bastante pelos seus escritos, nos quais diz ter estado com pessoas famosas e ter ser tornado a confidente da Imperatriz Josfina de quem publicou as alegadas “memórias secretas”. Embora sejam, praticamente, esquecidos , hoje em dia, Mlle Lenormand escreveu quatorze livros, nenhum sobre suas teorias do Tarô ou métodos de cartomancia, e sim sobre sua carreira e suas ligações com pessoas importantes. Sua preocupação não era de popularizar uma teoria ou sistema prático, mas propagar a crença em seus poderes como uma sibila.

Apesar disso, seu nome ainda é associado a um estranho conjunto de cartas, o “Grand Jeu de Mlle Lenormand”, ainda produzido pela Grimaud, a principal empresa francesa fabricante de cartas. Embora esse baralho bastante popular tenha 54 cartas, sendo 52 cartas “normais” e duas figuras extras, ele tem sido confundido, algumas vezes, com um baralho de Tarô, como deixam claro os títulos de dois livros recentes: Le Tarot de Mlle Lenormand (Paris, 1989) de Dicta e Françoise, e Votre Personalité révélée par le tarot de Mlle Lenormand (Paris, 1992) de Carole Sédillot. O mesmo acontece com uma derivação da tradição Le Normand, o “Petit Lenormand.  Nesse caso, o baralho é composto de 36 cartas e ainda é produzido no países germânicos de onde ele parece ser uma especialidade local.

É fácil compreender que o “Grand Jeu de Mlle Lenormand e seus primos alemães não têm qualquer relação com o tarô. Que os últimos não têm nada a ver com Mlle Le Normand, será claramente explicado e mostraremos que a  sibila não era tão interessada em previsões através de cartas. Marie-Anne Le Normand (1772-1843) é, finalmente, a figura mais proeminente de uma época que assistiu os os últimos magos fora de moda darem lugar aos modernos oraculistas que, parecem ter proliferado sob o reinado de Napoleão (1804-15).

O começo de Mademoiselle Le Normand
Apesar de clamar às “altas ciências”, a primeira principal ocupação de Etteilla, que era prever o futuro com as cartas, teve suas raízes na sociedade francesa. Embora uma lei punisse “pessoas fizessem a adivinhação  e prognóstico ou interpretação de sonho”  seu ofício, Paris estava cheia de cartomantes durante os primeiros anos do século XIX. Uma notícia de 1804 diz: “A polícia repreende leitores de cartas (‘tireurs de cartes em vão pois surgem novos, todos os dias.” Os arquivos de polícia revelam muitas dessas pessoas a quem Éloïse Mozzani evidencia num dos mais bem documentados capítulos de seu livro – Mozzani, 1988. capítulo XV  ‘Les tireurs des cartes sous Napoléon’. Cidadão ‘Irénée’ anunciava, em 1802 que ele continuava a ler cartas, oferecendo explorar o passado, descrever o presente e prever o futuro graças aos seus estudo da arte da Necromancia. Ele tinha, ainda, segredos exclusivos, como ler a clara de um ovo e a borra do café, além vender água de colônia. Detido, ‘Irénée confessou se chamar Bonier. Outra busca policial feita no apartamento de uma mulher chamada Gilbert, no mesmo, ano, revelou que ela possuía três baralhos, incluindo um que se chamava “Thot”’. Um homem chamado Lyonnais predizia o futuro na rue de Bucy. Quando a polícia chegou, apreendeu ‘dois baralhos contendo figuras estranhas, cada um.’

Madame Lacoste, a mulher Grangou, o cidadão Meyer, Mademoiselle Virignie, os Somonets, Madame Lebrun, a viúva Chevalier, sob o pseudônimo de ‘Madame Renard’ – Madamo Raposa – são somente alguns poucos nomes dentre os muitos praticantes citados por Mozzani que foram detidos e presos por curtos períodos pela polícia  durante os anos de 1801-9. Mlle Le Normand era, exatamente, do mesmo tipo exceto por ter escrito muitos livros. Isso fez uma grande diferença.

Embora tenha enchido seus livros com episódios de sua vida e as pessoas com quem encontrou e, embora, muitas obras tenham sido publicadas ao longo de sua carreira – há, pelo menos seis biografias, sem mencionarmos notas em dicionários – não é fácil delinear a vida real de Mlle Le Normand. Muitas de suas afirmações são ilegítimas, muitas de suas biografias são forjadas, reconhecidas ou não. Logo após sua morte em 1843, três livros foram publicados. O primeiro deles, La Sibylle de XIXe siècle, consiste no que pretende ser profecias feitas pela própria Mlle Le Normand, escrito pouco antes de sua morte com um comentário sobre elas e uma pequena biografia da autora; a biografia é anônima.

O autor do comentário intitula-se Hortensius Flamel, um pseudônimo, obviamente. O nome Flamel é claramente emprestado do célebre suposto alquimista do século XVI, Nicolas Flamel, o primeiro nome soa estranho. A identidade de Hortensius Flamel tem sido sujeita a muita discussão; devemos deixar nossas considerações sobre o assunto até o próximo capítulo. Parágrafos inteiros da biografia incluídos no livro são repetições, palavra por palavras, de um uma carta anteriormente publicada numa revista semanal chamada Le Tam-Tam (nº 29 de 9-15 de julho de 1843). Essa carta foi enviada ao editor por um senhor chamado Monsieur Alboise e foi dita ser baseada documentos não publicados vindos de Aleçon, local de nascimento da sibila.

Alboise – Jules-Édouard Alboise (ou Alboize) du (ou de) Pujol (185-54) – foi um contribuidor permanente da revista, como é indicado na página principal; ele era um dramaturgo, administrador de teatro, autor (sempre como colaborador) de pobres vaudevilles e superficiais romances de época. De acordo com a nota sobre ‘Lenormand’ no Nouvelle biographie génerale (Vol. 29, 1859), Alboise du Pujol era um parente de Mlle Le Normand, que teria casado com sua sobrinha e herdado papéis particulares a partir dos quais planejava publicar um ‘Memorial’; porém suas morte, como foi dito, impediu-o de realizar o projeto.
Logo após, em 1843, Francis Girauld, um poeta obscuro, publicou Mademoiselle Le Normand: as biographie, ses prédictions extraordinaires, ao qual ele adicionou uma “introdução filosófica nas ciências ocultas”, apresentando a história da adivinhação, leitura de mãos e cartomancia com os Tarôs Egípcios e o Jogo de Picket ‘como explicado pelas profetisas do século XIX’”. A capa alega que que é a única biografia “oficial”. A introdução e explicação da cartomancia com o Tarô são plagiados de Julia Orsini, Le Grand Etteilla, ou l’art de tirer les cartes, publicados publicados em Lille em 1838, enquanto a biografia é amplamente derivada de La Sibylle du XIXe siècle para os primeiros anos e dos escritos de Mlle Le Normand.

Ainda no mesmo ano, uma voz cética vou erguida por Louis Du Bois um folheto de 20 páginas intitulado De Mademoiselle Lenormand et de ses deux biographies, récemment publiées (Sobre Mlle Lenormand e suas duas biografias recentemente publicadas, Paris 1843). Baseado no livro de Girault, o autor ataca, impiedosamente, a veracidade de Mlle Le Normand e suas afirmações de ter feito profecias acertadas, sem oferecer evidências sólidas. Du Bois, que se denominava bibliotecário da École centrale de l’Órne (i.e. o departamento do qual Aleçon é a capital), abre seu panfleto declarando que Marie-Anne Le Normand não nasceu em 1772, como afirmado tanto por Girault como em La sibylle de XIXe siècle, mas a 16 de setembro de 1768, porém, mais uma vez, sem citar qualquer evidência.
Dois anos depois, Narcisse-Honoré Cellier du Fayel, ‘professeur à l’Àthénée royal, directeur du jornal Le génie des Femmes’ publicou La vérité sur Mademoiselle Lenormand (Cellier du Fayel, 1845), contando como conheceu Mlle Le Normand em seus últimos anos. Embora, primeiramente cético, foi convencido pelos seus talentos, tornando-se um amigo íntimo. Sua descrição é mais plausível que as anteriores e soa honesta a maioria das vezes.

Logo apareceram biografias em dicionários como o Dictionnaire des sciences occultes de Migne, (1855), no Nouvelle biographie general depuis les temps plus reculés jusqu’à nos jours (Vol. 29, 1859) de Firmin-Didot, e na nova edição de Biographie universelle ancienne et moderne (Vol. 24, c.1860), de Michaud. Elas refletem opiniões muito diferentes: As ferozes notas de Collin de Plancy são equilibradas pela biografia mais complacente assinada por  L. Boyeldieu d’Auvigny no dicionário de Lecanu. Porém, Lecanu, ansioso por mostrar distanciamento, acrescentou comentários críticos. A Nouvelle Biographie oferece uma nota favorável pela Ed. de Manne, mas a Biographie universelle é duramente crítica sob a caneta de Du Bois.

Outra parte não tão grandiosa foi pesquisada, em 1911, por Alfred Marquiset em seu La célèbre Mademoiselle Lenormand. Marquiset é bastante sarcástico, mas bem divertido – porém, seu livro é mais bem documentado até agora. Ele usou arquivos policiais bem como dedicatórias e manuscritos. O livro mais recente sobre Mlle Lenormand: Mademoiselle Lenormand: la reine de la voyance (1990), de Dicta Dimitriads não traz informações reais, sendo fortemente romanceado, usando, ainda, as mesmas estórias confusas e supersticiosas como fez Flamel, Girauld e outros de forma a apresentar suas heroína de forma bajuladora. Não é surpresa que a biografia de Marquiset não seja nem mencionada!

Marie-Anne Lenormand nasceu em Aleçon, na Normandia, em 27 de Maio de 1772. Até mesmo sua chegada no mundo é cercada de controvérsia; como vimos, um de seus muitos biógrafos, mantém que ela nasceu a 16 de setembro de 1768. Algumas décadas mais tarde, Ed. de Manne apresentou a sua data completa de nascimento, contradizendo Du Bois. Pesquisas recentes nos livros paroquiais  de Aleçon confirmaram que Marie-Anne-Adelaïde Le Normand nasceu e foi batizada no mesmo dia, 27 de maio de 1772. Seu pai, Jean-Louis-Antoine Le Normand era um comerciante de tecidos e morreu no ano seguinte. Sua mãe, Marie-Anne Gilbert, com quem Jean-Louis Le Normand casara em 1767, teve outro marido em 1774, Isaac Rosay–Desfontaines. Infelizmente, ela faleceu em 1777, deixando Marie-Anne órfã aos 5 anos de idade. Isaac Rosay casou-se de novo e mais outra vez em 1779, a segunda faleceu. Dessa forma, Marie-Anne Le Norma era uma estranha para os seus pais legais.

De acorodo com a carta de Alboise para a Le Tam-Tam, reproduzida por Flamel e Girauld. Marie-Anne deixou Aleçon, indo para Paris; não é certo se ela se juntou ao seu padrasto, Isaac Rosay-Desfountaines, que tinha se estabelecido lá e aberto uma loja na rue du Colombier, ou outro comerciante – talvez com a indicação de Isaac – ou ainda, se ela foi simplesmente atraída pela capital e saiu sem planos. Uma vez em Paris, é dito que reencontrou um conterrâneo, Jacques-René Hébert, que se tornaria famoso entre 1790 e 1794 com o seu Le Père Duchese, o mais bruto e violento jornal do período revolucionário. Ela se apaixonou por ele? Não há nada certo, mas não é provável que tenham sido amantes uma vez que a última confidente de Mlle Le Normand, N.-H. Cellier du Fayel, revela que ela morreu “em sua pureza natural de nascimento”.

Nada muito confiável pode ser estabelecido dos anos seguintes. De acordo com Dimitriadis que, não só confia em Flamel e Giraud, mas acrescenta muitos detalhes ainda desconhecidos, Marie-Anne Le Normand estava vivendo em precárias condições quando decidiu deixar Paris para ir para Londres e visitar o célebre Dr Gaal, com quem se encontrou em setembro de 1789. Entretando, Du Bois e Cellier apontaram que Gaal não só era desconhecido naquela época, como nem tinha deixado sua terra natal, a Alemanha. Além disso, ele não tinha exposto em francês suas pesquisas sobre crânios até 1808. Mesmo sendo uma profetisa, não seria razoável que a jovem Mlle Le Normand tenha ouvido falar das teorias de Gall em 1789! Também é uma extravagante superstição que ela tenha viajado sozinha para outro país aos dezessete anos.

Marie-Anne Le Normand nos diz que em 1793 ela era secretária do Monsieur d’Amerval de la Saussotte. Numa longa nota nos sues Souvenirs prophétiques d’une sibylle, ela explica como d’Amerval de La Saussotte, um opositor da realeza, planejou ajudar a rainha Marie-Antoinette a escapar da prisão. Marie-Anne se juntou ao plano, mas somente teve sucesso em encontrar-se com a rainha na prisão. Maria Antonieta, ela conta, tinha um baralho para ler a sorte. Infelizmente, como mostra Alfred Marquiset, tudo nessa história é uma farsa. Mlle Le Normand usou a moldura de um caso real – o ‘Caso dos Cravos’ – e, simplesmente, mudou os nomes, colocando o seu no lugar de um homem chamado Gonse, acrescentando mais alguns detalhes.

A segui, encontramos Marie-Anner sendo detida na companhia de Fraçois Flammermont e Louise Gilbert. De acordo com um documento arquivado reproduzido por Cellier du Fayel em 1845, eles foram sentenciados à prisão e multados em 10 livres no dia 20 de Floréal do ano II (9 de maio de 1794) por serem ‘diseurs de bonne fortune’( leitores da sorte). O ato menciona que eles usavam ‘convites’ e ‘cartas’. Todavia, Alfred Marquiset mostrou dúvidas quanto a esse documento que foi publicado somente em 1845 e ‘deve ter vindo direto da fábrica Lenormand’. No seu livro de 1814, Mlle Le Normand queixou-se de ter sido presa ‘sob o terrível sistema do Terror’ (ou seja, 1794); mas ela explica a sua estadia na prisão por ‘pregado uma contrarrevolução’!

A primeira evidência documentada que temos de Mlle Le Normand é nada mais que um jornal diário chamado Le mot à l’orreille, ou le Don Quichotte des dames (A palavra no ouvido, ou as mulheres de Don Quixote), cuja primeira edição apareceu no dia 11º Vendémiaire, ano VI (2 de outubro de 1797). Era uma gazeta simples, cheia de notícias, humor e notícias do Conseil des Cinq-Cents (Parlamento). A única alusão à divinação é a ‘previsão’ do tempo na sua quinta edição. Le mot à l’oreille não parece ter tido muito sucesso: depois de oito edições, Mlle Le Normand desistiu. Todavia, é interessante ler que ela é ‘editora-proprietária’ – na verdade ela se coloca como ‘rédactrice’, o que nos leva a crer que ela escreveu todos os artigos -  e que seu endereço seja ‘1153 rue de Tournon, faubourg Saint-Germain’.

É provável que esse seja o atual o nº5 da mesma rua. Embora a rue de Tournon não tenha mudado desde aqueles dias -  muitos dos edifícios são do final do século XVIII – a numeração atual só foi introduzida em 1805. Antes disso, eram usados sistemas diferentes baseados em todo o distrito envolvendo números altos. É verdade que Jacques-René Hérbert tinha seu negócio lá até 1792. Foi inferido que Marie-Anne Le Normand foi a sucessora de Herbert em sua loja, mas não temos indícios reais de sua situação durante a revolução. Cellier du Fayel cita que ela só se estabeleceu em 1799 – embora saibamos que ela já havia se estabelecido lá desde 1797 – acrescentando que o número 1153 rue de Tournon se tornaria número 9. Para Marquiset, ela estaria viveu no número 9 ‘por volta de 1798’, mudando-se para o número 5. Mas, numa carta que Mlle Le Normand enviou à Imperatriz no dia 28 de novembro de 1804, ela ainda dá o endereço como ‘rue de Tournon nº1153, fabourg Saint-Germain’. A situação se torna complicada com o  arranjo das premissas: nº5 e nº7 de um prédio com três lojas e uma entrada principal. Uma vez numerado ‘5’, a localização na rue de Tournon permaneceria o endereço da célebre sibila até seus últimos dias.

Já era Mlle Lenormand, popular? Não há evidências a não ser em sues próprios escritos. Ela, realmente, leu a sorte para o conde de Provença que se tornaria o Rei Luís XVIII, Mirabeau, general Hoche, Camille Desmoulins, Danton, Saint-Just, Marat, Barras, Robespierre, Talleyrand, o ator Talma e,por úlitmo mas não pior, Joséphine de Beauharnais? Louis du Bois demonstrou que isso seria logicamente impossível para muitos deles , já em 1843. Cellier du Flamel duvidou de qualquer celebridade. Para ele, Marie-Anne Le Normand viveu humildemente até 1800.

Alfred Marquiset ofereceu uma boa reconstrução hipotética das Ascenção de Mlle Lenormand: ‘O primeiro lugar que fez suas tentativas foi nos barcos das lavadeiras, sempre apaixonadas uma necromanciazinha; por alguns centavos elas as alimentava com maravilhosas esperanças que elas não resistiriam em contar aos seus clientes tais maravilhas. Passo a passo, ela chegou aos comerciantes, então à burguesia, e às mulheres do mundo através de suas criadas; daí até à alta sociedade só era preciso mais um passo. Encontrando-se com pessoas de alto nível, Mlle Le Normand aprimorou sua educação preocupando-se com o conhecimento específico que precisaria para o seu ofício. Desenvolvendo sua astúcia normanda ela pôde arrumar relações secretas todos os lugares e deslumbrar, frequentemente, com suas revelações tendo pago por isso do seu próprio bolso.

A vidente de Joséphine
No dia 2 de maio de 1801, Marie-Anne Le Normand foi convidada a ir até la Malmaison, a residência de Joséphine de Beauharnais numa aldeia a oeste de Paris. Marie-Josèphe-Rose Tascher de La Pagerie, a primeira esposa de Napoleão Bonaparte, nasceu na Ilha da Marinica em 1763. Ela se casou com Alexandre de Beauharais em 1779, então, depois da morte de Beharnais em 1794, casou com Bonaparte em 1796. Como o convite foi anônimo, Mlle Lenormand não tinha a menor ideia de quem encontraria. Foi pela sua arte da quiromancia que ela identificou Joséphine – a quem não, aparentemente, não reconhecera apesar dos seus primeiros clontatos durante o Terror. Não somente estava ela diante da esposa do primeiro cônsul, como o próprio Napoleão Bonaparte estava lá. O único problema é que nossa única fonte disso é o próprio livro de Mlle Le Normand, Les Oracle sibyllins ... de 1817.

É incerto que ela tenha mesmo se tornado parte das relações de Joséphine, uma vez que Alfred Marquiset cita um cartão postal de 28 de novembro de 1804 na qual Mlle Le Normand endereça à Imperatriz como uma ‘sybille [sic para sybille]française’ ‘implorando humildemente à Sua Majestade Imperial para em sua bondade conceder-lhe  um grande favor’: o ‘livro do destino’ disse-lhe ‘que receberia um pequeno trabalho de sua digníssima pessoa.’
Mais uma vez, é difícil separar o que é verdade e o que pura invenção. Mademoiselle Ducrest, que visitava Joséphine de Beaharnais frequentemente, concorda que ela tinha inclinações para superstições e adivinhação. Alfred Marquiset também se refere à Duquesa d’Abramtès a à ‘Mademoiselle Avrillon’, ambas dando evidência de que Josephine teria consultado Mlle Le Normand, diretamente ou através de um mensageiro.Todavia, historiadores provaram que as duas últimas foram forjadas como muitas outras memórias no período Napoleônico. O que é óbvio é que Marie-Anne Le Normand se aproveitou bastante da situação. Não só contou sobre seus alegados encontros com Joséphine com riqueza de detalhes em muitos de seus livros como ainda publicou Mémoires Historiques et secrets de l’imperatrice Joséphine, Marie-Rose Tascher de La Pagerie, em duas edições, 1820 e 1827, orgulhando-se de ter sido confidente e conselheira de Joséphine.

Relatos mais sérios evidenciam grandes contrastes. Um documento policial relata: ‘há multidões na Lenormand, a famosa leitora de cartas da rue de Tournon’, e acrescenta que Metternich, o home o estadista austríaco, então embaixador em Paris, visitou-a em 1808. Jacques-Barthélémy Salgues, no seu Des erreurs et des préjugés répandus dans la société (Dos erros e preconceitos na sociedade) foi forçado a confessar que ‘longas filas de carruagens’ esperavam em frente  em frente à ‘famosa senhorita L.R.’, significando Le Normand. Então, Mlle Le Normand estava em voga e rica. Parece que ela comprou uma casa de campo em Migneax (perto de Poissy, Yvelines), por volta de 1802 e, provavelmente, mais tarde, um apartamento na rue de la Santé, em Paris. Talleyrand, Mme de Staël e Talma podem a ter consultado.

Mas há um lado negro. No seu L’hermite de la chausée d’Antin, Victor-Étienne Jouy conta: “Há uma sibila moderna em Paris cuja reputação e sustento se baseiam somente na credulidade infantil de das mulheres da melhor sociedade...” é no centro de Paris, na rue de Tournon, no enigmático letreiro do Bureau de Correspondence générale’. Os arquivos policiais revelam que ela era constantemente detida e presa. Em dezembro de 1803 ela foi manda para a prisão no ‘Madelonnetes’ por sua ‘sala de estar ser um antro de conspiradores’. Os relatos policiais multiplicaram. Em setembro de 1804 conta que ‘Mlle Le Normand, que reside na rue de Tournon engana tolos todos os dias. ’

O grande assunto de 1809 foi o divórcio de Napoleão de Joséphine. Mlle Le Normand foi detina em 15 de dezembro como consta nos realtos policiais. “A mulher Normand [sic], que ganha a vida lendo a sorte, foi presa. Quase todo o tribunal costumava consulta-la sobre atualidades. Ela fez horóscopos de para as pessoas mais importantes e ganhava mais de 20.000 francos por ano com o ofício.’ Mas temos outra testemunha: a própria Marie-Anne Le Normand. Ela usou um livro de 602 páginas (Les souvenirs prophétiques d’une sibylle...), publicado em 1814, para nos dizer porque e como ela foi para cadeia por alguns dias em 1809. Ela foi interrogada sobre seus clientes, técnicas e previsões e, então, liberada. A verdadeira razão da sua detenção, ela conta, foi por ter previsto o divórcio de Napoleão de Joséphine e tentado impedi-lo. Desde então, a polícia pareceu deixá-la em paz.

Em 1812-13, Mlle Le Normand tinha uma livraria na rue du Petit-Lion-Saint-Sulpice (ou Petit-Bourbon-Saint-Sulpice, a rua próxima rua depois da Tournon), que deve ter comprado de um antigo livreiro, Fréchet, em cerca de 1810. Foi nesse endereço que ela publicou seus primeiros livros.

Le souvenirs prophétiques foi publicado ‘à Paris, chez l’autir, rue de Tournon, nº 5, et à son magasin de librairie, rue du Petit-Bourbon-St-Sulpice, nº1 (‘pode ser adquirido com o autor, ... e em sua livraria...). O livro foi editado por Lenormant, um editor que não tem qualquer relação com Marie-Anne. A gravura mostra a chegada dos policiais na sala de consultas de Mlle Le Normand. Um prefácio (‘Petit avant-tout’) apresenta o livro que é organizado como uma história sequencial: primeiro, ‘Ma vision’, então ‘Le réveil’ (‘o despertar’), ‘Le depart’ (‘A partida’), ‘Premier interrogatoire’ (‘Primeiro interrogatório’), ‘Deuxième interrogatoire’, seguido pelos onze dias de sua prisão, algumas ‘reflexões’, ‘uma palavra no ouvido’, o ‘billet doux’, uma viagem ao inferno, uma ‘Description de l’île d’Elbe’, e, por último, mas não menos importante, algumas 282 páginas de notas!

Como podem imaginar, não precisamos resumir esse livro sufocante cujo propósito era mostrar o quão brilhante ela se comportou e o quão ridícula foi a polícia e, é claro,  promover sua arte e previsões. Nesse fluxo de situações falsas e digressões históricas, ainda assim conseguimos pegar algumas das técnicas divinatórias da sibila. Em ‘Le rèveil’ (pp.8-9) ela litas alguns de seus instrumentos, os quais explica em generosas notas: O espelho flamejante de Luca Gaurico, as trinta e três varetas gregas, sua ‘cabale de 99 de Zoroastre’, sem mencionar seus grimórios, sua varinha divinatória, seu precioso talismã... Mas a primeira pergunta dos policiais é sobre leitura de cartas: ‘Vou faites le cartes (26)?’ (você lê as cartas?). Na sua resposta ela lhe oferece uma leitura. Mas a promissora nota 26 é decepcionante. Estranhamente, Mlle Le Normand insere um conto popular conhecido como ‘a história de Grenadier Richard’, onde um soldado assiste uma missa com um baralho de cartas na mão e, quando repreendido, explica que cada carta tem um significado bíblico. No segundo interrogatório, ela é, mais uma vez questionada sobre as cartas. Marie-Anne Le Normand econtra uma oportunidade de nos contar a origem das cartas de jogar na sua nota número 31, referindo-se ao abbé de Longuerue e a Jacquemin Gringonneur. Supreendentemente, não uma nota seque, sobre o tarô em toda a obra!

O livro foi um evento único. Reviews apareceram no Le Nain Jaune de 20 de março de 1815 e no Le Journal des Débats, onde Hofman, seu editor, publicou uma série de artigos em agosto e começo de setembro de 1815. Marie-Anne Le Normand respondeu no Le Courrier de 20 de setembro.
A volta dos Bourbons
Marie-Anne Le Normand sempre alegou ser da realeza. Não só tinha simpatia pela família real em 1793 com, é claro, previu a Restauração de 1814-15 (mas não previu os “Cem dias de Napoleão”!). Era de se esperar que, depois de um pequeno livro celebrando o aniversário da morte de Joséphine, ela publicou La sibylle au tombeau de Louis XVI (A sibila no túmulo de Louis XVI, Paris, 1816) onde ela se encontra com um anjo que lhe narra a batalha de Waterloo através de um generoso vasto relato!!! ... Logo depois, em 1817, Les oracle sibyllins foi publicado. Esse volumoso livro é a continuação do seu Souvenirs prophétiques e no mesmo estilo, ela tenta provar que  previu a queda de Napoleão. Nós sabemos que o imperador gostava de ler as obras de Mlle Le Normand, mas que não acreditava na bizarra visão que tinha. Ela revela um pouco de sua técnica  e, particularmente, seu método de leitura de cartas. Ela, claramente, usa um jogo de piquet , ex. baralho de 32 cartas. Ela cortava três vezes e dispunha as cartas em oito montes. Então, começava as tirava e começava a leitura. Apesar de citar as cartas que tirou para a leitura, ela não tem problemas em descrever seu significados!

Algumas linhas a frente ela dá mais explicações: ‘o Rei de Espadas, junto com o 8 de ouros, significa que um homem habilidoso parou julgamentos, se possível, o avanço de uma doença ... Felizmente, o 9 de  copas, que está no topo, que verá, rapidamente, o fim de suas cruéis precupações’ (pp. 151-2). Como se pode ver, seu sistema é bem simples, sem nenhuma teoria elaborada. Uma grande revelação nos espera na página 159: O uso de CARTAS DE TARÔ – escrito tharots, na época – é, finalmente, mencionado por Mlle Le Normand. Como sempre, ela é bem vaga: ‘O louco, que estou tirando de sua mão significa que seus projetos são insustentáveis.’, diz ela (p.159), então: ‘Mas eu vejo o Diabo ao lado da Morte’ (p. 160). Nenhum significado é dado, mas uma vez que o consulente bateu em sua mesa e derrubou seua ’78 cartas de tharot’, podemos supor que não foram boas notícias. Os nomes das cartas de tarô mencionadas por Mlle Le Normand não podem ser encontradas no Grand Etteilla I, onde são chamadas, respectivamente: Folie, Force majeure e Mortalité. Fol, Diable e Mort são, atualmente, nomes clássicos no tarô de Marselha.

Outras técnicas divinatórias são mencionadas no resto do livro: économancie (ex.: previsão com uma bacia de água fresca com folhas de louro e verbena, mais sal!), o aço eléctre (que ‘só há na Europa’), os nove pontos do livro de Thoth (sem qualquer explicação), leitura de mãos, é claro (com uma grande nota 14), onomancia, com a clara do ovo, chumbo derretido, etc. Ela lista o que ela trazia consigo: ‘meus diferentes tharots, meu grande grimório, minhas famosas chaves [de Salomão], Cornélius Agrippa, minhas varas gregas, meu espelho mágico, o tratado dos sonhos, segundo Joseph, minha famosa varinha divinatória, 9 dracmas de chumbo fresco, sete pedaços de cera ... , borra de café o anel cigano’ (p. 337). Isso é, no mínimo, a parafernália de uma feiticeira. Nenhum método cartomantico é apresentado, mas há uma descrição de como Mlle Le Normand usa as suas varas gregas: ‘Pego minhas 33 varas gregas e jogo-as aqui e ali, numa área triangular, porém tiro, com cuidado, o terrível Agamenon e seus seguidores, fazendo isso de novo, sete vezes.’ (p. 196).

Em outubro, uma nova oportunidade foi dada à Mlle Le Normand para aumentar sua fama ‘internacional’. Para lutar contra Napoleão, o Czar Russo, o Imperador Austríaco e o Rei da Prússia, uniram-se, em 1815 no que foi conhecido como ‘Sainte-Alliance’. Em outubro e novembro de 1818 reuniu-se um congresso em Aachen para decidir o futuro da França. Marie-Anne Lenormand decidiu ir lá por sentir sua presença necessária. Para impressionar os monarcas a quem iria aconselhar, alugou uma carruagem, deixando Paris em grande ostentação. Mas foi parada na fronteira pela alfândega belga. O estranho equipamento que funcionários da alfandega encontraram na bagagem de Mlle Le Normand levantou suspeitas, então ela foi enviada para Toirnai e, então para Mons para que se descobrisse quais eram os seus planos. Aparentemente, nada perigoso, pois liberaram-na três dias depois. Depois do congresso, ela foi para Bruxelas onde, ela nos conta, foi fervorosamente recebida.

Pelo menos, todos esses eventos foram assunto para um novo livro que ela própria publicaria no ano seguinte, embora esteja datado 1818: La sibylle au congès d’Aix-la-Chapelle em 1818, sendo seu título feito, claramente, a partir do L’observateur au congrès, ou Relation historiques et anecdotiques du Congrès d’Alaix-la-Chapelle em 1818 (o oberservador no congresso, ou consideração históricas e pessoais do Congresso de Aachen, Paris, A. Eymery,1818). O último livro foi escrito pelo jornalista Charles-Maxime de Villemarest e dá conta da tão comentada presença de Mlle Le Normand em Aachen, descrevendo como ela, em primeira mão, espalhou rumores e situações de pessoas bem-informadas (pp.151-2). O livro da própria Mlle Le Normand, por outro lado, é mais um guia turístico, contando como ela foi para Bélgica – sob domínio da Holanda, então – foi parada por parada pela alfândega e, finalmente, chegou a Achen, da qual oferece uma descrição completa, emprestada, em grande parte, do Guide des étranger, de J.-B. de Bouge ou Itinéraires de la ville d’Aix-la-Chapelle (Guia do estrangeiro ou Passeios na cidade de Aachen, Bruxelas, 1806). Ela fala muito pouco sobre ter encontrado pessoas importantes lá, mas dedica uma grande parte à descrição de um encontro com um profeta chamado Muller. Muller tendo-a convidado a ir à Bruxelas, ela termina o livro com um tour pela capital belga.

Tarôs também são usados nesse livro. O índice traz um capítulo promissor intitulado ‘Y a-t-il quelque de philosophique dans les Tharots?’ (Há algo filosófico no Tarô?). Pelo menos iremos, aqui, saber o que Mlle Le Normand achava do tarô. Ela nos preparou para isso: Acionando sua ‘gande cabale’, ela divide suas figura egípcias (‘mês tableaux égyptiens’) em nove (p. 51). Ela comenta que, embora um baralho pareça algo frívolo, é merecedor de atenção filosófica. Mais a frente, ela descreve os utensílios familiares que lhes cercavam e menciona os tarôs, ‘figuras emblemáticas e hieroglíficas’ (p. 193). Depois de termos aguentado uma descrição completa de Aachen, chegamos agora, tremendo de emoção, ao centro da contribuição de Mlle Le Normand para a teoria do tarô. Decepcionantemente, o capítulo é somente a descrição de seu quarto no Hôtel de Bellevue. A única frase que ela dedica ao tarô é  seguinte: ‘mês tarots m’offrent de singulières réflexions’ (‘minhas cartas de tarô me oferecem algumas curiosas reflexões’)!

Uma das obras primas de Mlle Le Normand foi, certamente, Mémoires historiques et secrets de l’impératrice Joséphine, Marie-Rose Tascher de La Pagerie, première épouse de Napoleon Bonaparte; orné de cinq gravures, portrait et fac-similé (Paris, 1820, 2 vol.), onde ela conta a vida da primeira esposa de Napoleão. Não será surpresa se você ouvir dizer que a heroína da história é, na realidade, Mlle  Lenormand no seu papel de confidente e conselheira da imperatriz. Ela não deixa de mencionar seus destacar seus grande méritos e visões históricas. Alguns meses antes, um ‘Prospecto’ da assinatura anunciava o livro, alardeando ‘o luxo da tipografia, as finas gravuras’. Os compradores podiam assinar ‘au magasin de libraire, rue du Petit-Bourbon-St-Sulpice, nº 1’. Essa seria a última menção da livraria de Mlle Le Normand por nenhum dos dois volumes dar esse endereço. Os livros  seguintes não o mostram.

O Mémoires historiques et secrets rapidamente levaram à reações negativas, J.-M. Deschamps, secretária particular de Joséphine, protestou com uma carta bastante sólida no Le Currier Constitutionnel and Le Courrier Français de 8 de novembro de 1820. Na La Gazzete de France de 4 de dezembro de 1820, Colnet mostrou que a obra era uma confusão de erros. Embora ela tente apresentar Joséphine de forma positiva, os admiradores de Napoleão chamaram de traição. O julgamento de Marquiset é duro: ‘é um romance cruel’, ‘quase tudo é falso na obra’ e, mais, ‘além desses anacronismos, o Mémoires são essencialmente a história de Napoleão sem imaginação e equivocadamente contada.’ Historiadores modernos não são menos críticos. Eles, geralmente, tomam a obra de Mlle Le Normand sobre Joséphine como puramente um logro. Para Pr. Jean Tulard eles são ‘inteiramente apócrifos’.

Apesar disso, o Mémoires historiques deve ter tido algum sucesso e pode ter sido o primeiro best-seller publicado por Mlle Le Normand. Chegou a segunda edição aumentada com as últimas palavras de Napoleão em Saint Helena acrescentadas. Sua fama cruzou fronteiras: Mémoires historiques foi traduzido para o alemão em 1822 sob o título: Historische und geheine Denkwürdigkeiten der Kaiserin Josephine,... ersten Gemahlin Napoleon Bonaparte..., traduzido por August von Blumröder e publicado pela Sondershausen. Finalmente, uma tradução para o inglês, feita por Jacob M. Howard apareceu nos Estados Unidos, em 1847, em Chicago e na Filadélfia, simultaneamente: Historical and secret memoirs of the empress Joséphine (Marie-Rose Tascher de La Pagerie), firt wife of Napoleão Bonaparte. Translated from the French by M. Howard. Foram reeditados várias vezes em 1848, 1850, 1852, 1854 e mais tarde, até a virada do século.

Parece que Mlle Le Normand se sentiu humilhada com a reação sarcástica da imprensa parisiense. Em 25 de fevereiro de 1821 ela deixou Paris e se estabeleceu em Bruxelas. Os clientes vieram, rapidamente, consultar seus oráculos. Mas a polícia foi igualmente rápida em prendê-la, e Mlle Le Normand foi detida em 18 de abril de 1821. Após prestar depoimentos e passar por revistas, ela foi indiciada por fraude e levada a julgamento em Louvain. Em 7 de junho ela foi sentenciada a 1 ano de prisão e multada em 3 florins. Ela entrou com recurso contra a sentença, sendo novamente levada a julgamento perante a corte de Bruxelas. A sentença de prisão foi retirada e Mlle Le Normand multada em 15 francos que se recusou a pagar. Livre, Mlle Lenormand deixou Bruxelas em 15 de agosto de 1821.

Toda essa história deu origem a um novo livro.Souvenirs de la Belgique foi publicado em 1822, ‘à Paris, chez l’auteur, rue de Tournon, nº 5, et MM. les principaux libraire de la capitale’. Marie-Anne Le Normand conta-nos duas memórias de ‘100 dias de má sorte’, aos quais acrescenta suas ‘notas históricas e políticas’. O livro foi ilustrado com um retrato da autora em sua prisão em Bruxelas. Como nas obras anteriores, há notas de rodapé e finais; há, até mesmo, notas de rodapé para as notas finais! As 415 páginas são salpicadas com lições de história, digressões de fatos, e citações em francês, latin e até inglês (sem qualquer referência). É uma narrativa fantasiosa do que que aconteceu do começo ao fim, no seu obsessivo desejo de provar que estava certa, ela anexa 80 páginas de documentos autênticos (declarações de testemunhas, minutas de audiências, memorandos que foram publicados em defesa de sua posição).

Todas as ‘vítimas’ cartas comuns e de tarô usadas para previsões. Como em seu Sibylle au congrès d’Aix-la-chapelle, Mlle Le Normand evita responder perguntas diretas sobre o tarô. No capítulo intitulado ‘Mon interrogatoire’ (meu interrogatório), onde ela reporta perguntas e respostas à sua maneira, um consulente pergunta: ‘O que esses tharots , que parecem ter hieróglifos, significam?’ (p.39). Mas sua reposta tem a ver com quiromancia!

De volta à Paris, Marie-Anne Le Normand dedicou-se a escrever uma pilha de livros,  os quais aparecem em várias listas em suas obras publicadas. Em outubro de 1824, logo após a morte de Louis XVIII, ela publicou uma visão do ‘anjo protetor da França no túmulo de Louis XVIII’, no qual previu um longo de feliz reinado de Carlos X – que foi deposto pela Revolução de 1830. A morte do Czar Alexander I, em 1825 inspirou um novo canto na sobra de Catherine II em seu túmulo. Ela oferece uma assinatura de quarenta e quatro obras adicionais seus; entre os quais foram anunciados, mas nunca apareceram, foram suas próprias memórias e livros sobre o filho de  Joséphine, Eugène de Beauharnais e sobre a Rainha Guilhermina.
De acordo com Dicta Dimitriadis, Mlle Le Normand viajou para Londres, de novo, em 1822 e juntou-se a uma sociedade chamada ‘Membros of Mercurii’; ela chegou a dirigir uma revista intitulada The Straggling astrologers of the 19th century, em 1824. Tudo isso é contradito por uma carta de Mlle Le Normand e, 20 de janeiro de 1823 para Messrs. Truttel e Würtz, comerciantes de livros, em Paris, negociando a venda de três dúzias de cópias de seu Souvenirs de la Belgique por 178 francos e esperando aumentar os negócios com eles durante ‘esse ano, 1823’. É difícil imaginar como ela poderia estar vivendo em Londres entre 1822 e 1824, naquela época, quando estava publicando seu Souvenirs de la Belgique (1822), em Paris, e então, L’ange protecteur de la France ao tombeau de Louis XVIII (1824)! Como era de se esperar, ela nunca fez alusão à essas maravilhosas aventuras em suas publicações posteriores.
Seus últimos anos
Depois da Revolução de julho de 1830, um monarca novo, mais liberal, ocupou o trono francês. Contrariamente às suas previsões, seis anos antes, Carlos X foi expulso da França e seu primo Louis-Philippe se tornou rei da França. Marie-Anne Le Normand era monarquista, mas parece ter sido apoiadora dos antigos Bourbons. Sua fama estava minguando, também,  apesar do apoio de Guizot, um dos mais influentes ministros do governo e Émelie de Girardin, uma dos principais nomes da imprensa. Ela, també, converteu Narcisse-Honoré Cellier du Fayel, um próspero advogado que queria encontrar-se com a ‘charlatã’. Cellier du Fayel foi convencido por seus oráculos e, em pouco tempo, tornou-se seu confidente e biógrafo.
Na sua Biografia de 1843, Francis Girault nos conta como, em 1835, chegou à sala de consulta de Mlle Le Normand uma mulher velha e pobre, desconhecida por ela. A mulher confessou ser a viúva de Fouquier-Tinville, o sinistro promotor público da Revolução Francesa que foi guilhotinado em 1795. Claro que ela teve muito o que falar e seus escritos secretos era de grande interesse para a sibila. Mas esse vem a ser outra farsa: como lembra Alfred Marquiset, Mme Fourquier-Tinville morrera sete anos antes!

A veia literária de Marie-Anne Le Normand ainda não tinha se esgotado. Entre 1831 e 1833, quatro últimos livros foram lançados da sua ‘e de fábrica’ e muitos outros foram anunciados. Publicado em janeiro de 1831 e dedicado, L’ombre de Henri IV au palais d’Orléans (A sombra de Henri IV no palácio de Orleans [ex.: o Palais-Royal]) uma mistura chata de visões, diálogos e aulas de histórias e notas de rodapé para mostrar o quão precisa era a sua previsão de eventos de 20-22 de dezembro e que deveriam ter aparecido em 20 de dezembro de 1830. Se tivessem, poderíamos, finalmente, ter testado a as extraordinárias profecias de Olivarius, de 1542. Philippe-Dieudonné-Noël Olivarius, ela nos conta em suas notas de rodapé (2), página 16, escreveu 919 previsões até 1982. Ela se orgulha de ter comprado esse único manuscrito que foi caçado ‘em todas as bibliotecas’. O próprio para maravilhou-se. Cinco fólios são reproduzidos em L’onbre de Henri IV (pp. 18-28), com notas explicando o significado de ‘algumas velhas expressões francesas’.

Essa não foi a primeira vez que Mlle Le Normand falou sobre esse mago desconhecido. Ela já tinha publicado uma de suas previsões em 1820, no Mémoirs historiques et secrets de l’imperatrice Joséphine. De acordo com ela, é Napoleão quem é mencionado na profecia de Olivárius para Marie-Anne em 1814. Mais fólios foram publicados nos próximos livros: um em Le petit homme rouge au château des Tulieries (julho, 1831), outro em Manifeste des dieux sur les affaires de France (janeiro, 1832) e os fólios 8 a 10 foram apresentados no último livro publicado por Mlle Le Normand, Arrêt suprême des dieux de l’Olympe, data em 28 de fevereiro de 1833.

O ridículo ‘estilo literário antigo’ dos textos de Olivarius é tão obviamente forjado que Alfred Marquiset dedicou um apêndice inteiro para revelar esse ‘attrape-nigaud’ (codinome). Ele não só mostra que não qualquer verdade em nenhuma das afirmações de Le Normand, mas que o logro foi desenvolvido por outros escritores. Henri Dujardin, L’oracle pour 1840 (Paris, 1839), diz que conhece três pessoas chamadas Olivarius, das quais, um deixou um livro, Petri Joannis Olivarii Valentini de prophetia et spiritu profético liber, publicado em Basel, em 1543, para ser encontrado da Biblioteca Real sob inventário número Z 985. Você se surpreenderia se ouvosse que essa referência é falsa? Um dos outros dois, um Olivarius foi Philipe-Dieudonné-Noël, cujo texto é, atualmente, apresentado como um livro publicado em 1544 e intitulado Prévisions d’um solitaire, e um terceiro escreveu o celebrado ‘prophétie d’Orval’ (outra profecia forjada que foi publicada pela primeira vez o Journal des villes et des  campagnes de 20 de junho de 1839). Eugène Bareste deu mais crédito ao Olivarius em seu muito popular Prophéties: La fin des temps, avec une notice, do qual foram publicadas quatro edições, em 1840.

Le petit homme rouge au château des Tuileries; La vérité à Holy-Rood; Prédictions, etc (The little red man no castelo de Tuileries; A Verdade em Holy-Rood; Previsões, etc), publicados  em julho de 1831, introduzem um novo profeta: o Petit Homme Rouge (o Pequeno Homem Vermelho). Em 1831, Marie-Anne Le Normand  os conta que uma velha e curvada mulher apareceu no castelo de Tuileries laçando maldições contra os Bourbons. Ela era a encarnação da República de 1793. O Petit Homme Rouge estava lá e replicou. Sua longa fala revelou que era o organizador de todos os eventos passados desde 1789. Por que Louis XVI perdeu o torno? Porque Blondinet (‘loiro’), por entendermos ser esse seu nome, decidiu que o rei não mais poderia reinar. Quem protegeu Napoleão? O pequeno home vermelho, é claro! Os leitores dos Oráculos Sibilinos de Mlle Le Normand repararam que o pequeno homem vermelho tinha sido mencionado na obra (p.340).

De fato, Marie-Anne Le Normand não inventou o Petit Homme Rouge. Provavelmente, ela teve a ideia a partir de um curto folheto contra Napoleão, publicado em 1814 e intitulado Le petit homme rouge. As seis páginas descrevem a última assembleia de Napoleão encontrando-se em Tuileries e a chegada de um pequeno homem vermelho, um gênio aterrorizante, um ‘homem de fogo’, cujo contato queimava quem o tocava. Essa criatura infernal estava lá para levar Napoleão para o Inferno. O Petit Homme Rouge fez outra aparição algum tempo depois do livro de Mlle Le Normand. Messrs de Pixérécourt, Brazier e Carmouche escreveram uma peça com o mesmo nome: Le petit homme rouge, ‘folie-féerie romantique em quatre actes et na vaundevilles, imitée du genre anglais’ (Vaunndeville de quatro atos loucos e extravagantes, em estilo inglês), apresentada no Théâtre de la Gaieté, em março de 1832. A música era de Alexandre aventuras foram publicadas, anonimamente, em 1843 sob o título ‘Memoirs et prophéties du petit homme rouge, par une sybille [sic], depuis la Saint-Barthélemy jusqu’à la nuit des temps; como veremos mais tarde, Paul Christian iria ressuscita-lo num livro publicado em 1863: L’homme rouge des Tuileries

Novas revelações e previsões foram publicadas em 1832 com o Manifeste des dieux sur les affaires de France: apparition de S.A.R. la feue Mm ela duchesse douairière d’Orleans (Marie-Louise-Adélaïde de Bourbon-Pentièvre), descendante de Louis XIV à son fils Louis-Philippe Ier, roi des Français, Révélations (Manifesto dos deuses sobre os negócios franceses: aparição de H.R.H. a última viúva de Orléans..., descendente de Louis XIV, para seu filho Louis-Philippe I, Rei da França. Revelações), publicado em 21de janeiro de 1832 por Mlle Le Normand, ‘editeur-libraire’, e Dondey Duprey père et fils, que foram os tipógrafos de parceiros de Mlle Le Normand desde 1824. Embora amparados por mais ‘feuliet’ das profecias de Olivarius, essas recomendações em fevereiro de 1833 sob o título Arrêt suprême des dieux de l’Olympe em faveur de Mm ela duchesse de Berry et de son filleul le duc d’Aumale d’Orleans (Henri Eugène-Philippe-Louis). Révélations, etc, etc. (Decreto supremo dos deuses do olimpo em afilhado, duque de Aumale-Orléans...) “Essa pequena brochura[ela nos avisa na contra-capa da folha de rosto] foi anunciado para 19 de novembro de 1832. Amigos não oficiais me fizeram retirar a promessa de adiar essa publicação até 28 de fevereiro de 1833. “Já basta, disse um deles, que você foi capaz de prever o nascimento do Duque de Bordeaux, o nobre heroísmo de sua mãe; é certo: Mme a Duquesa de Berry será resgatada de Blaye” ‘.
Mrie-Caroline, Duquesa de Berry tentou incitar algumas províncias contra Louis-Philippe, em 1832; ela foi detida e presa em Blaye, perto de Bourdeaux. Porém, uma vez mais Mlle Le Normand não previu o fim burlesco dessa ventura fadada ao fracasso. Ela não soube que a duquesa estava, secretamente, grávida – não de seu marido legítimo, uma vez que o Duque de Berry tinha sido assassinado em 1820. Em 1833, alguns meses após o livro ser publicado, a Duquesa de Berry deu a luz a uma filha inesperada que escandalizou muitas pessoas e descredibilizou a causa Legitimista por muitos anos. Poderia, muito bem, ter descredibilizado Mlle Le Normand uma vez que esse seria o seu último livro.

Todavia, muitos outros escritos estavam sendo preparados. Na lista onde registra seus trabalhos publicados, Marie-Anne Le Normand anuncia alguns novos livros por vir: Les mystères de Blaye, Jeanne d’Arc au Louvre, com o horóscopo da Duquesa de Berry, La sibylle à Londres, Louise Wilhelmine de Prusse, ou les infortunes d’une grande reine, com o qual já nos deparamos, Anecdotes historiques, politiques, etc. sur la reine d’Angleterre (Caroline-Amélie-Elisabeth de Brunswick); particularités secretes sur la princese Caroline d’Anglaterre, première épouse de S.A.R. le prince de Saxe-Cobourg, o qual jamais nos consolaremos de termos perdido, e, por último o há muito esperado Mémoirs historiques, politiques, souvenirs, confessions, correspondances secretes de Mlle Le Normand, cujos dez volumes, infelizmente nunca apareceram.

O renome de Mlle Le Normand, embora, provavelmente, em declínio, ainda chamava a atenção de alguns leitores da sorte. Em 1838, uma Mlle Brunet distribuía panfletos onde se apresentava como discípula de Mlle Le Normand. Marie-Anne manifestou-se, imediatamente, na la Gazzete des Tribunaux, lembrando seus leitores que ela não tinha alunos. Então, foi um simples adepte que publicou, em 1842, Le rèvèlateur du destin, ou Livre merveilleux des bramines, pour connaître le présent, le passé et l’avenir, par um apdete de Mlle Lenormand (O ilmuninador do destino, ou o Maravilhoso livro dos Brâmanes, de forma a saber o presente, passado e futuro, por um adepto de Mlle Lenormand). Uma coleção íntegra de oráculos legítimo catálogo da Bibliothèque Nationale atribuído a Aguste Martres.

O fim chegou em 25 de junho de 1843. Marie-Anne Le Normand faleceu em seu apartamento na rue de la Santé. Seu funeral, em 27 de junho, foi extraordinário. A igreja foi coberta com enfeites, o carro fúnebre foi puxado por quatro cavalos enfeitados e seguido por cem pessoas! Não restam dúvidas que essa cerimônia barroca foi cuidadosamente preparada. Foi um acontecimento importante no mundo da adivinhação: a terra tremeu e tudo saiu do lugar. A jogada de Mlle Le Normand reviveu o interesse em sua carreira e deu aos jornais boas razões para crônicas sarcásticas. Um longo artigo, por Jules Jain, apareceu no sério Journal des Débats (de julho de 1843), outro por Léo Lespès no seu concorrente Le Constitutionnel (suplemente de 16 de julho). Le Charivari, Le Globe e pelo menos outros três publicaram artigos sobre sua vida. Antes de julho acabar, foram publicadas biografias que analisamos no começo do capítulo. A lenda se cristalizou e um exército de ‘alunos’, ‘adeptos’ ou discípulos foram rápidos em se rivalizar.

A sucessão de Mlle Le Normand
O único herdeiro dos bens de Mlle Le Normand foi o seu sobrinho de 37 anos, Michel-Alexandre Hugo, um segundo tenente da infataria, filho de sua irmã mais nova, Marthe-Sophie. Sua fortuna foi estimada em 500.000 francos, mas, na verdade, eram somente 120.000 dos quais perto de 80.000 foram deixados como heranças pessoais e mais em várias reivindicações concedidas pelo tribunal. Na edição de 16 de julho, o jornal parisiense Le Charivari publicou um pequeno artigo sobre a sucessão de Mlle Le Normand, concluindo que ela não tinha nenhum sucessor(a), porém um grande número de senhoras leitoras da sorte dividiriam a sucessão entre si. O artigo mostra espanto com o número de profissionais, então, atuando em Paris, que estabelecia em cerca de 50, que divulgavam seus serviços nos jornais e quem presumia serem todas mulheres. Ele escolhe três para descrever separadamente. A primeira, Mme Clément, descrevia os anuncios como ‘uma encantadora adivinha cuja jovem reputação se equiparava à de Mlle Le Normand.’

Que Ela alegava ter previsto o futuro de Marie-Louise, segunda Imperatriz de Napoleão e de sua própria queda já sabemos; se assim fosse, ela não poderia ser tão jovem. Ela se especializou em previsões, por meio de cartas, de desastres grandes e pequenos, vestia manto preto e capuz vermelho e viveu, segundo o artigo, no andar térreo de um sob um notário. Infelizmente, não é dado o seu endereço, mas em 25 de julho, um mês depois da morte de Mlle Le Normand, Mme Clément reivindicou a sucessão instalando-se no mesmo apartamento térreo na rue de Tournon,5, onde a famosa sibila fez suas consultas por muitos anos. Em seu livro, publicado alguns anos mais tarde, Mlle Lelièvre nos conta como o sobrinho de Mlle Le Normand, encontrando entre suas coisas, uma carta escrita a ela por Mlle Lelièvre, com bons comentários acerca do destinatário, escreveu para lhe oferecer uso do apartamento e seu recheio; ele ofereceu, também, convencer os clientes de suas tia para serem transferidos para ela, dizendo que seria a única capaz de ser sua sucessora. Mlle Lelièvre recusou, sabendo de que precisava de mais estudos e consciente de que nem o apartamento de Mlle Le Normand, nem a sua mobilha a concederiam o talento requisitado: de olho em Mme Clément, ela declara que consideraria isso puro charlatanismo. Evidentemente, o tenente Alexandre Hugo, então, descobriu  Mme Clément e fez-lhe a mesma oferta, que foi prontamente aceita.

As duas outras senhoras descritas pelo Charivari foram Mme Albin r Mme Melchior, ambas tendo a borra de café como seu oráculo de preferencia. Mme Albin era especializada em consultas para previsão de casamentos, heranças e outros eventos felizes. Mlle Melchior era idosa e dedicava as manhãs para as tarefas domésticas, deixando fim da tarde para fazer encoarajntes previsões por 20 sous a consultation, para sua pobre clientèle.
Antes de julho de 1843 acabar, a editora Lange-Lévy publicou La sibylle du XIXe siècle, de Flamel, já mencionado. Num prefácio, o editor, escrevendo sob o nome de A. Gallus, esclareceu que, após quarenta e oito horas da morte da sibila, ele recebeu um pequeno caixão de um remente anônimo. A carta que o acompanhava dizia que, alguns meses antes, Mlle Le Normand, de quem ele era um amigo próximo, confiou-lhe o caixão, instruindo-lhe a publicar as profecias manuscritas contida nele após sua morte. Gallus, revelando a crença de que o remetente era um dos executores de Mlle Le Normand, explica que publicaria essas grandes profecias de forma célere. Ele não pondera porque um executor procederia de forma tão clandestina, ou revela os passos que deu para verificar a autenticidade do manuscrito, mesmo pela comparação de caligrafia.  Ao invés disso, ele convidou Hortensius Flamel, ‘o célebre autor de Le Livre rouge’, para escrever um comentário.

A publicação, como um todo, traz os sinais de uma farsa. Flamel pode, possivelmente, ter feito, ele mesmo, as profecias; mais provavelmente ele pode ter sido colocado com um cúmplice. As profecias, duas por página, variam em precisão, uma vez que são muito vagas ou muito obscuras para se provarem erradas. Que o reino se tornaria  um Império, pela segunda vez,  se provou correto em poucos anos; que as pessoas viajariam pelo ar demorou mais ainda para se verificar. Que a Suiça seria invadida por todos os lados e deixaria de existir, em pouco tempo, foi um tiro fora do alvo; igualmente que a Cruz substituiria o Corão em Constantinopla.

O breve comentário de Flamel é superficial e composto, em grande parte, por generalidades. Certas pessoas possuem o poder de prever o futuro, e Mlle Le Normand o tinha em alto nível; suas previsões eram  invariavelmente precisas. Qual comentário mais claro poderia ser feito de profecias já, totalmente, explícitas? Só o último parágrafo do comentário revela um motivo a mais para a publicação. “Quando ouvimos falar da morte de Mlle Lenormand, nos perguntamos se uma nova estrela iria brilhar nos céus proféticos para substituir a que acabara de perecer. Olhamos e um raio luminoso nos alcançou. Como Arquimedes, o que introduz as ciências ocultas, eu gritei, “Eureca”. Mme Clément é a nova perita que erguerá, para nós, os véus que cobrem o futuro.’ É de se duvidar que Famel tivesse o mínimo interesse no assunto, mas o editor estava, certamente, interessado em a reforçar a alegação de Mme Clément à sucessão. O comentário de Flamel é seguido por uma biografia de Mlle Le Noramand, anônima, que verificamos ter sido baseada na carta de Alboise de Pujol para o Le Tam-Tam, publicada um mês antes. A partir dela, ficamos sabendo que ela começava suas consultas, perguntando para o consulente detalhes pessoais, incluindo sua data de nascimento, as iniciais de seu nome de batismo e local de nascimento, sua cor, animal e flor favoritos e o animal que mais detestava. Também tomamos ciências da variedade técnicas divinatórias das quais se valia. No meio da biografia é colocada uma breve menção à Mme Clément: ‘Não esqueçamos de dizer que já nesse tempo, uma sibila igualmente famosa, uma estrela dos céus proféticos, proferia seus oráculos e leituras do futuro. Na Alemanha, Mme Clément previu o futura grandeza da Imperatriz Marie-Louise.’ A repetição da frase sobre a nova estrela, sugere que Flamel teve alguma participação na composição da biografia, que termina com mais um elogio à Mme Clément: “A última sibila não está morta. Aqui está outra que surge, não menos ilustre, não menos formidável: é a pitonisa de Delfos, é Mme Clément. Seu tripé está erguido, seu livro do destino, aberto; suas cartas, prontas. À ela pertence o reino do futuro.”

‘Nunca vimos Mme Clément, continua o autor, ‘mas ouvimos muito a seu respeito; e o que ouvimos foi tão extraordinário que seria preciso um volume inteiro para contar... É na caverna da sibila falecida, na mesma casa onde Mlle Lenormand viveu que a profetisa do momento faz suas maravilhosas previsões.’ ‘O passado é de Mlle Lenormand’, conclui seu biógrafo, ‘o futuro pertence à essa estrela profética, Mme Clément. Assim com as sibilas como com os reis: a sibila morreu, vida longa à sibila.’

Os louvores extravagantes de Mme Clément podem sugerir algum grau de conluio entre o tenente Hugo e os autores dessa ilegítima obra pós-morte, umas vez que o sucesso de Mme Clément seria importante para Hugo como beneficiário do aluguel. A suspeita seria equivocada; e a motivação para a vasta promoção de Mme Clément permanece obscura.
Pouco depois, no mesmo ano, foi publicada a biografia de Mlle Le Normand por Francis Girault plagiada de várias fontes. Girault publicou como apêndice algumas ligações com Alexandre Hugo. Primeiro, uma carta datada de 22 de julho de Hugo para os editores, Breteau e Pichery, referindo-se ao livro de Flamel, denunciando as profecias com os mais fortes termos como falaciosas – um julgamento com o qual Du Bois, posteriormente, concordou -  e acusando Breteau e Pichery de publica-las. Os editores acusados, evidentemente, não viram razão para resposta; mas Girault respondeu, entregando o manuscrito de sua biografia a Hugo, na rue de Tournon,5, negando qualquer responsabilidade pelo livro de Flamel da sua parte ou de Messrs Breatrau e Pichery. Em sua resposta de 29 de julho, Hugo se desculpou por sua falsa acusação, e aceitou a obra de Girault como a biografia oficial de sua tia.

A esperança de Mme Clément em se tornar tão famosa quanto Mlle Le Normand foi frustrada; e se Lange-Lévy esperava que ela publicasse algum livro que escrevera com eles, frustraram-se, por ela tê-los publicado por sua conta.’ Em 1844 ela produziu um livreto de 64 páginas, Le Corbeau sanglant, ou l’Avenir dévoilé (O Corvo Sangrento, ou o Futuro Revelado). O título se refere, explica Mme Clément, à técnica divinatória romana de examinar as entranhas de um corvo. A capa traz o endereço da autora, como própria editora, e como ‘a casa ocupada por Mlle Le Normand, rue de Tournon, 5’. O frontispício é uma gravura litografada de Mme Clément, uma bela senhora usando um cocar de aparência Asteca, do qual seu cabelo cai em cachos. O método divinatório que explica segue diretamente a tradição de Etteilla, as cartas que usava sendo as do jeu égyptien ou de Thot (o tarô de Etteilla numerado de 1 ao Louco, com 78 cartas). Ela afirma ser clara ao explicar seu sistema, mas não consegue. A tiragem é simples: as treze primeiras cartas são viradas e lidas, então dezenove e, finalmente, vinte e uma, as cartas lidas, são, a cada momento, devolvidas ao maço que é re-embaralhado antes de ser tirado o próximo conjunto de cartas. É dada uma lista se significados das 78 cartas, baseada em Etteilla, porém, sem qualquer referência à sua posição invertida. Embora o instrumento seja o baralho de Etteilla, o coração de Mme Clément está na astrologia. As cartas numeradas do naipe de ouros são identificadas com símbolos ‘cabalísticos’ dos planetas, a cabeça e cauda do dragão e a parte da fortuna, aos quais são associadas 12 previsões de acordo com as 12 ‘casas’ (signos) zodiacais em que estiverem. Mme Clément, volta, na segunda parte do livro, ao que acredita ser mais interessantes para o público, um horóscopo para homens e mulheres de acordo com o mês que nasceram, seguido de uma descrição de vários temperamentos (fleumático, sanguíneo, etc) e de como ler a personalidade pelas características físicas.

Certamente não há, aqui, uma grande sibila: somente uma praticante inexperiente.
Em 1852, Mme Clément publicou outro livreto, Le Flambeau de l’avenir (A tocha do futuro), do mesmo tamanho, ainda da rue de Tournon,5, denominado ‘a antiga livraria de Mlle Lenormand’, abaixo do nome da autora está inscrito algo meio patético ‘a sucessora de Mlle Lenormand’. A mesma gravura de Mme Clément meio borrada, forma o frontispício. É interessante ressaltar que Mme Clément usa, repetidamente, o termo de Etteilla ‘cartonomancia’, embora o livro seja supostamente sobre a técnica de ‘cartomancia’, não há virtualmente, nada nele sobre o uso de cartas. A falta de importância. Tal inconsequência só leva à suspeita de que a pobre senhora não esta em seu juízo perfeito. Sob o ‘sistema’ principal ela diz que deve-se, primeiro, perguntar ao consulente para que se conheça detalhes pessoais do mesmo como o que gosta e o que não gosta (a prática atribuída à Mlle Le Normand). Ela passa, imediatamente para o segundo ‘sistema’, que não é sistema nenhum além de um discurso confuso sobre a astrologia e as virtides cardinais, aludindo às obras do ‘grande Thot’. Ela termina com sitações históricas de previsões acertadas.

Em 1847 havia um livro interessante publicado, fora do meio literário cartomântico. Justifications des sciences divinatoires (Justificativas das ciências divinatórias) por Mlle A. Lelièvre.. O catálotogo da Biblioèque Nacionale apresenta o nome do autor como um pseudônimo de Marc-François Guillois, mas essa atribuição é, praticamente, um absurdo. Pseudônimos ou supostos pseudônimos são, para bibliotecários como atribuições à obras de arte a artitas individuais são para historiadores da arte; eles os investigam religiosamente, mas, quando não há evidências sólidas, eles irão se agarrar na mais inconsistente base para para uma identificação. Guillois foi o autor de textos políticos publicados em 1795, 1797, 1801, 1816 e 1831; não há motivos para que se suspeite dele como autor de obras sobre artes divinatórias em 1847. Além disso, não é apenas uma questão de pseudônimo. O livro de Mlle Lièvre é dedicado à condessa Marie d’Adhémard com expressões da mais profunda gratidão por sua ajuda e amizade, contendo um amplo conteúdo autobiográfico, dando nomes a várias pessoas como Monsieur Saint-Prix, que, em 1830 tomou-a como aluna Théâtre-Fraçais e tratou-a como uma filha (p.49). O livro seria completamente inútil se tudo isso fosse fictício, mais, o edereço da autora está impresso na capa, de forma que seria fácil identificar qualquer farsa. Não há motivo para não aceitar Mlle Lelièvre, como um escritor posteriormente o fez, como uma sibila genuína escrevendo sob seu próprio nome.

A maior preocupação do livro é recontar como Mlle Lelièvre veio, em 1840, a adotar a profissão de leitora da sorte. Embora Mme Clément em momento algum seja mencionada, denegrir suas alegações de ser a sucessora de Mlle Le Normand é, claramente, algo secundário. A autora conta (p.66) como uma amiga sua pede à Mlle Le Normand para tomar Mlle Lelièvre como sua pupila, mas Mlle Le Normand responde dizendo que não tem alunos; entretanto, ela permite que Mlle Lelièvre tire as cartas em sua presença. Numa nota de rodapé Mlle Lelièvre diz, ‘Tenho diante de mim uma carta tirada por uma certa senhora’. – certamente, Mme Clément – ‘afirmando ser ela a única discípula de Mlle Le Normand. Ela é, meramente, a única  a ter reivindicado o título com o intuito de enganar as pessoas; essa senhora não é mais discípula de Le Normand que eu e, talvez menos.’ Já foi dito como, após a morte de Mlle Lenormand, seu sobrinho ofereceu o apartamento de sua tia à Mlle Lelièvre  e ela rejeitou a proposta. O livro foi reeditado no ano seguinte com um novo título Proohéties de la nouvelle sibylle. Não é apropriado, uma vez que o livro não contém profecias, mas é obviamente feito para conter a alegação implícita de ser a verdadeira sucessora de Mlle Le Normand; ela descreve, ingenuamente, como sonhou que Mlle Le Normand lhe disse ‘ Você me substituirá e seu nome fará o meu ser esquecido.’

Mlle Lelièvre praticava quiromancia e cartomancia, a última tanto com baralho comum como com os tarôs egípcios de Etteilla. Seu livro não contém nenhuma instrução para essas artes, depois de uma longa seção autobriográfica, ele consiste em uma série de casos falando sobre previsões bem sucedidas efetuadas por várias técnicas divinatórias. A seção de cartomancia repete as fantasias contidas no livro de Frédéric de la Granfe, Le grand livre du destin que foi publicado dois anos antes sobre a história da arte. Marie Ambruget e Fiasson aparecem na obra, como na obra de la Grange; sua história sobre o Duque de Orleans, Mariette e Brivazac é atribuída à ‘memórias secretas’. Mlle Lenormand, estamos seguros disso, tinha o livro de Thot sempre sob seus olhos; nesse caso, Mlle Lelièvre a imita.
De acordo com Éloïse Mozzani, Mlle Lelièvre morreu em 1849. É muito difícil dizer que tanto ela quanto Mme Clément provaram serem a real sucessora de Mlle Le Normand. Outas cartomantes fizeram similares alegações com fundamentos menos consistentes. Mme Lacombe, que morreu em 1846, trabalhava no número 1 da rue Boucher, estabeleceu-se como ocupando o lugar de Mlle Le Normand, enquanto em 1848, Mme Morel divulgava-se numa publicidade impressa como ‘amiga íntima e discípula de Mlle Le Normand’ o que nunca foi. Entretanto, não nos surpreende que quando, em 1854, Mme Eugénie Bonnejoy Pérignon revelou a escolha de Mlle Le Normand de uma sucessora, concedida após sua morte, que deveria ser provado que não seria nenhuma das senhoras que se afirmavam como tal, mas um homem. Ele era Edmond; porém sua história está reservada para o próximo capítulo.

Mlle Le Normand era, realmente, uma ‘cartomante’?
Marie-Anne Le Normand constantemente se denominava sibila ou ‘profetisa’ (pythonisse) e costumava sustentar seus livros em suas visões e profecias. Quando se permitia falar sobre suas técnicas divinatórias ela evocava um impressionante catálogo de instrumentos mágicos: O espelho flamejante de Luca Gaurico, as trinta e três varas gregas, a ‘cabale de 99 de Zoroastre’, alguns grimórios, uma varinha divinatória, seus preciosos talismãs, o aço électre, as chaves de Salomão, o anel cigano, a(s) flecha(s) de Abaris, uma lupa mágica, etc, etc. As cartas não foram esquecidas, mas não foram, obviamente, colocadas em primeiro lugar. Tarô, sempre escritos tharots, não são frequentemente mencionados. Quando elas os usa, é como os outros instrumentos, de forma confusa e nebulosa, geralmente, qualificada como ‘misterioso’,’mágico’, etc o que lhe permite manter tudo muito vago.

Entretanto, vários relatos – registros policiais e publicações literárias - revelam que ela usava tarôs e cartas comuns como todos os ‘tireuses de cartes’. Os documentos que foram usados para acusa-la em Bruxelas, em 1821 que ela obsequiosamente reproduz no final do seu Souvenirs de la Belgique, dizem todos que ela recebia seus clientes com cartas comuns e tharots, dependendo do que pudessem pagar.

No seu L’hermite de la chaussée d’Antin (Paris, 1813), Victor Étienner Jouy explica como ela operava: ‘passado, presente e futuro serão expostos juntos sob seus olhos graças a um simples baralho. Entretanto, devo dizer que essas cartas são muito maiores que as outras, decoradas com hieróglifos [“tarotées em forme d’hiéroglyphes”]. A feiticeira as embaralha, meditando de forma edificante, e as combina através das habilidosas combinações de Etteilla’. Outro relato inesperado é dado pelo Barão Karl August von Malchus (1770-1840). Embora sendo um economista e estar longe de acreditar em leitura da sorte, Malchus consultou Marie-Anne Le Normand entre 1810 e 1814. Se suas memórias, que foram publicadas pela primeira vez no Die Geheimwissenschaften de  Carl Kieserwetter (Leipzig, 1895) não foram forjadas, temos, aqui, uma ótima descrição do ritual da sibila.

Malchus confirma que ela começa com perguntas para extrair detalhes pessoais do consulente e, então, começa a jogar as cartas. Por estar familiarizado com diferentes padrões de cartas como eram usadas nos países de língua alemã, Karl August von Malchus ficou impressioando com o número de cartas usados por Mlle Le Normand e oferece uma descrição detalhada delas. Tarokkarten, alle deutsche Karten [‘cartas normais alemãs’ antigas, por exemplo, com naipes alemãs], Whistkarten [significando, provavelmente, cartas francesas modernas], Karten mit Himmels-körperen bezeichnet [“cartas com corpos celestes”],  mit nekromantischen Figuren, etc’. A sibila insistia em que se cortasse com a mão esquerda e, supreendentemente, misturava cartas de baralho diferentes! Por exemplo, 25 cartas de um baralho de tarô, 6 de outro, 10 deum terceiro. ‘Ela separava as cartas escolhidas e as dispunha na mesa de acordo com uma ordem específica; todas as cartas de cima eram colocadas ao lado’. Ela continuava com a leitura de mãos.

Pode causar surpresa o relato de ‘corpos celestes’ e ‘figuras necromânticas’, por ser algo parecido com o que observamos no ‘Grand jeu de Mlle Le Normand’. Como Malchus morreu em 1840, não pode ter visto o ‘Grand jeu’ que só foi publicado em 1845. Porém, muitos tipos de cartas divinatórias foram publicadas, somente em 1845. Muitos tipos de cartas divinatórias foram produzidas desde o começo do século XIX. A maioria continha alegorias emprestadas do Grand Etteilla. Um baralho chamado ‘Petit Necromancien’ foi produzido por Robert em cerca de 1810.

Podemos considerar Le Normand uma seguidora de Etteilla? A reposta é não. Não só é o seu método simples e vago como seu uso constante de um baralho de 32 cartas indica que ela não seguia Etteilla. Suas alusões ao tarô são tardias (nenhuma nates de 1817), sendo esquivas e nada claras. Vimos que ela não usava o Grand Etteilla uma vez que as três cartas que cita em Les Oracle Sibyllins, em 1817 não apresentam nomes típicos que Etteilla lhes atribuía, mas que são atribuídos ao tarô de Marselha. Outro fato notório é Mlle Le Normand nunca menciona Etteilla em nenhum de seus livros! Contudo, alude a Moult, Nostradamus, Cagliostro, a quem dedica longas notas, Nicolas Flamel, o Conde de Saint-Germain e Mesmer, sem falar de pessoas ‘mais sérias’ como Lavater ou Gaal, não há uma só palavra sobre Etteilla ou seus discípulos, nenhuma alusão às suas teorias. Court de Gebelin também não é mencionado.

É claro que isso não é totalmente verdadeiro. Entre as 248 notas de seu Souvenirs prophétiques (1814), ela tem uma nota sobre Hermes a quem lista com outros ‘cabalistas’ [!] na página 268. Sua nota nº238 (pp. 582-3) dá, simplesmente, uma breve apresentação de numerologia, porém é referida como ‘Science des Signes’. Provavelmente, o que se pretende aqui é o opus magnum de D’Odoucet, mas é impossível de se verificar se a citação pertence a algum dos 3 volumes. Há uma enigmática alusão ao Livro de Thot em Les oracles sibyllins (p.176): Mlle Le Normand diz que ela segue ‘par les dix-neuf points du livre de Thot...’ (através dos dezenove pontos do Livro de Thot’) para a qual não dá qualquer explicação. E, vimos que  V.-E. Jouy, descrevendo negativamente suas atuações negativamente, alude às ‘habilidosas combinações de Etteilla’. Mas isso é, provavelmente, alguma confusão feita pelo escritor.

O ‘Grand jeu de Mlle Lenormand’ e outros baralhos Lenormand
O nome de Mlle Le Normand também está ligado a um baralho cartomântico especialmente projetado, o ‘Grand jeu de Mlle Lenormand’, ainda editado pela Grimaud, a principal produtora de cartas. Baseado num baralho de 52 cartas, ele inclui duas cartas extras representando um homem e uma mulher, significadores dos consulentes. Como Prof. Detlef Hoffmann observou, as cartas não seguem nenhum sistema identificável, sendo assim, ‘um dos complicados baralhos divinatórios’. Cada uma das 52 cartas mostra uma cena central (‘grand sujet’) cercado por símbolos diferentes. No canto superior esquerdo, há uma miniatura de uma carta normal, no canto direito superior, uma letra aparece com um tema geomântico abaixo; entre eles há uma constelação celeste. Na parte esquerda inferior duas figuras são separadas por uma flor.

Esse baralho de caras ‘astro-mitológico-herméticas’ apareceu pela primeira vez, dois anos depois da morte de Le Normand. Era vendido com uma coleção de 5 livros sob o título genérico de Grand jeu de sociètè et pratiques secretes de Mlle Le Normand (O grande jogo da sociedade e práticas secretas de Mlle Lenormand), por ‘Mme la comtesse de ***. O editor dá seu endereço – mas não o seu nome – como 46 rue Vivienne.

O primeiro volume, Explication et application des cartes astro-mythol-hermétiques, avec de nombreux exercices sur les fleurs, les animaux et d’um double dictionnaire de fleurs emblématiques, é uma explicação das cartas com muitos exercícios de flores, animais, cores e talismãs,  junto com um tratado de geomancia e um dicionário de flores emblemáticas. Sua capa promete ‘um baralho de 54 cartas coloridas’. Uma publicidade colocada no fim do 3º volume diz que as cartas foram impressas em litografia colorida por Engelmann e Graf, a célebre companhia que introduziu a litografia na França e foi pioneira na sua aplicação com cores, da qual ‘Grand jeu de sociètè’ está entre seus primeiros exemplares.

A coleção continua com a parte 2: Astrologie ancienne et moderne contenant toutes les tables nécessaires pour dresser toutes sortes de thème, em quel lieu et pour quel que ce soit; suivi d’um traté des nombres cabalistiques (Astrologia antiga e moderna contendo todas as tabelas necessárias para desenhar todos os tipos de mapas em qualquer lugar, para qualquer um, seguida de um tratado sobre números cabalísticos); Parte 3: Traité complet de chiromancie ancienne et moderne; suivi d’um petit traité de physiognomonie et craniologie, d’aprés Lavater et Gall (Tratado completo de quiramancia antiga e moderna; seguido por um pequeno tratado sob fisiognomonia e craniologia, segundo Lavater e Gall), publicado atualmente ‘au dépôt du Grand jeu de société; Parte 4: Le jeu de la fortune, ou response des dieux, déesses, demi-dieux et héros de l’antiquité aux questions qui leur sont adressées sur les destinées humaines (O jogo da sorte ou resposta dos deuses, deusas, semideuses e heróis da antiguidade para questões às quais são perguntados sobre destinos humanos); parte 5: Les oracles de douze sibylles, ou solutions par les nombres aux questions proposées (Oráculos das doze sibilas, ou soluções para perguntas propostas por números), todos publicados em 1845.

Essa ‘obra imensa’, ‘bem escrita e arranjada’ é, supostamente para ser colecionada pelos ‘femme d’esprit’, de quem o nome deve permanecer oculto. As explicações das cartas são vagas reminiscências do Petit Etteilla, mas atribuem vários significados para diferentes assuntos. Em qualquer caso, eles não correspondem a menor alusão encontrada nos escritos de Mlle Le Normand. Além disso, é claro que ela usava um baralho de 32 cartas. Os volumes seguintes trazem indícios óbvios de uma obra apócrifa: nem seu estilo nem sua terminologia tem qualquer relação com qualquer tema de  Mlle Le Normand. O volume 1 foi reeditado por Breteau em 1865. Era vendido com a nova edição das cartas ‘atro-mitológicas-heméticas’, impressas em litografia de crayon por Bertatus e coloridas à mão.
O ‘Grand jeu de Mlle Lenormand’  fez surgir uma cópia adiantada: em cerca de 1850 a editora de J.F. Aug. Reiff publicou um baralho de 55 cartas cujos títulos das cartas tem a marca ‘Wahsage-Karten der berühmten Mlle Lenormand’ (cartas divinatórias de Mlle Lenormand). As cartas são arranjadas de forma diferente: cena central está na parte inferior da carta e figuras pequenas aparecem no centro. As contelações foram omitidas.

Baralhos mais recentes surgiram por volta de 1850 sob o nome de ‘petit lenormand’. Sua composição de 36 cartas aponta para países germânicos ao invés da França, onde tal composição não era usual desde o século XVII; sua iconografia simples não tem nem a ver com o ‘Grand jeu de Mlle Le Normand’ nem com os métodos de leitura de cartas próprios de Mlle Le Normand. As miniaturas de cartas que, por vezes, substituem as marcas francesas na parte central superiora, mostram padrões de naipes típicos da Alemanha e França. Cada carte tem somente um símbolo: um anel, um navio, um coração, etc. Fabricantes de carta alemães, austríacos e, até mesmo, belgas e suíços fabricavam e ainda fabricam esses ‘Petit Lenormands’. Incrivelmente, esse tipo de cartas nunca foi produzido na França.

Detlef Hoffman mostrou que seu protótipo pode ter, claramente , vindo de um lindo baralho de cartas peculiares chamado ‘Das Spiel der Hofnung’ [sic] / Le jeu de l’esperance’ (O jogo da esperança), publicado por volta de 1800 por G.P.J. Bieling de Nuremberg. Supreendentemente, ele não é um um baralho divinatporio, mas um jogo de tabuleiro! O folheto que o acompanha (Das Spiel der Hofnung [sic], mit einer neuen Figurenkarten von 36 illum. Blättern. Zwite verbesserte Auflage, ex. O jogo da esperança, com novas cartas ilustradas [feitas] de 36 iluminuras. Segunda edição ampliada) descreve  as regras: as cartas devem ser arranjadas para formar um quadrado de 36x36 em ordem numérica. Dois dados são usados e cada jogador move seu peão de acordo com os dados até a trigésima sexta carta. Como nos jogos de tabuleiro, há casas que de sorte e azar. Todavia, nas últimas linhas do texto dizem que ‘com as mesmas cartas pode-se fazer um divertido jogo de adivinhação’. É um sistema simples de pergunta-resposta usando somente 32 cartas dispostas em 8 fileiras de 4 cartas. As cartas são gravadas e belamente coloridas à mão. Cada uma possui duas cartas em miniatura : uma de naipes alemães conhecidos como ‘padrão Ansbach’ e o a outra do assim chamado ‘padrão bávaro-parisiense’ (naipes franceses). Os símbolos e números são os mesmos nos baralhos posteriores.

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No final, a carreira de Mlle Le Normand provou ser muito bem sucedida. Seu modernos senso de publicidade e seu uso da mídia do momento – livros circunstanciais, artigos da imprensa, mesmo os adversos, sem falar da grandiosidade de seu funeral – conderam-lhe fama universal. A única coisa que lhe interessava era deixar seu nome para posteridade. Nenhuma teoria ou mensagem. Ela não criou ou inspirou a criação de qualquer baralho de cartas divinatórias. Escreveu muitos livros, porém, todos focados em suas visões e encontros históricos. Ela mal sabia o que era o tarô e nunca mencionou Court de Gebelin, Etteilla ou seus seguidores. Mas os anos não eclipsaram seu nome: ela permanece a maior cartomante de todos os tempos.